

O Bibendum anuncia em 1946 o
Michelin X, o primeiro pneu radial no mundo; embaixo a edição inicial de
1900 do guia de estradas e hotéis


O trem Micheline com pneus,
usado em Madagascar dos anos 50 aos 70, e o Centipede, com 10 pneus,
dois motores V8 e suspensão Citroën


Inovações: o Tweel (em cima),
pneu com estrutura que não usa ar; o TRX (à esquerda) de perfil baixo e
o PAX, capaz de rodar mesmo vazio

O Challenge Bibendum, o "rali
dos carros verdes", mantém a linhagem competitiva da Michelin, agora
associada à preocupação ambiental |
O
aro removível, que era transportado na lateral ou traseira do automóvel,
surgia em 1906. Logo depois vinham os pneus duplos traseiros para
caminhões e ônibus. Os primeiros aviões também os usavam. Em 1920 a gama
de pneus na fábrica contava com tipos macios, mais confortáveis e de
pressão mais baixa, e pneus mais duros para suportar cargas. Eram
adequados tanto para veículos leves ou pesados. Os negócios iam muito
bem e em 1927 era criada a primeira fábrica fora da França, em
Stoke-on-Trent, no norte da Inglaterra. Outro marco importante foi a
criação de pneus para uso em estradas de ferro, em 1929. Eram chamados
de Pneurail e no princípio foram usados em pequenos trechos entre
cidades. Depois começou seu emprego na capital francesa, em 1951, e até
hoje são muito usados no metrô de Paris, dando mais conforto aos
passageiros dos vagões. Têm a particularidade de rodarem um
perpendicular ao outro: os movimentos laterais tornam-se menos bruscos e
deixam o rodar mais macio.
Em 1931 era a vez dos vizinhos alemães ganharem uma fábrica francesa de
pneus. Nesse ano André falecia aos 78 anos. Dois anos depois, tendo o
filho de Édouard, Pierre, como representante, a Michelin salvava a
empresa de André Citroën da
falência e dava andamento a projetos importantes como o modelo
Traction Avant. Na época era
lançado o pneu com lamelas ou frisos, dando mais aderência em chuvas.
Era chamado de Super Confort Sport. Sua pressão era baixa, em torno de
23 lb/pol², e duravam até 30 mil quilômetros. Lançado em 1937, o pneu
Pilote dava maior estabilidade em curvas para os automóveis com alto
desempenho. Já existiam fábricas na Espanha e na Bélgica. Um ano depois
chegava ao mercado o primeiro pneu com aros metálicos internos, que
aumentavam a rigidez da carcaça, a durabilidade e a resistência a altas
temperaturas.
Também nesse ano morria Pierre Michelin, então com 34 de
idade, em um acidente rodoviário. Ele estava então no comando da
Citroën. Em 1940 falecia Édouard, aos 81, e na Segunda Guerra Mundial
foi a vez de Marcel, filho de André, perder a vida em uma batalha. Foi o
fundador da Associação Esportiva Michelin e era um entusiasta na empresa
nas atividades esportivas.
Apesar da morte de quatro homens importantes e empreendedores, a família
continuava os negócios e após a guerra, em 1946, lançava o pneu radial
X. Inventado pela casa francesa, provou ser muito melhor que aquele de
construção diagonal e tornou-se
referência em todo o mundo. Os europeus foram os primeiros a adotá-lo em
massa. Além de ser mais flexível, o carro ficava bem mais estável e o
pneu durava muito mais. O grupo se expandia pelo mundo e já havia
unidades fabris na Holanda, no México e no Canadá.
Em 1960 a maioria dos
carros na Europa já rodava com pneus radiais. Apenas os mais simples
mantinham o conceito diagonal. Nesse ano estavam disponíveis para ônibus
e caminhões os pneus sem câmaras de ar, mais duráveis e seguros. Tal
como o radial, esse tipo foi muito bem aceito na Europa e depois em
outros locais. No período a empresa era dirigida por François Michelin,
filho de Étienne, que morrera em 1932, e neto de Édouard. Outra novidade
da época eram pneus para caminhões fora de estrada. Com aspecto pesado
tal qual o veículo, um dos primeiros tinha altura de 3,58 metros e 1,16
m de largura. O recorde foi batido quando fabricaram para um caminhão
enorme, usado em mineração, um pneu com 1,48 m de largura e 4 m de
altura. Seu peso era de cinco toneladas, fazendo o caminhão amarelo
ficar ainda mais assustador.
Em 1963 era inaugurado em Ladoux, cidade na região de Clermont-Ferrand,
um campo de provas com 32 quilômetros de extensão que empregava pistas
de asfalto liso, rugoso, paralelepípedos, terra, lama, neve e pistas
inclinadas. Simulava com eficiência todas as condições impostas a um
automóvel em qualquer condição de uso nas várias regiões do planeta.
Dois anos depois era lançado o pneu XAS, que trazia estrutura e desenho
assimétricos. Tornou-se um dos preferido
dos pilotos de competição na Europa, seja para pistas em circuitos, seja
para ralis. Era bom no seco, no molhado ou na neve. O ZX, de 1967,
atendia ao código de velocidade S, para
até 180 km/h, e podia equipar a maioria dos sedãs da época. Um ano
depois chegavam os pneus XWX, que atendiam à categoria V (210 km/h),
sendo adotados em marcas de prestígio como Porsche, Mercedes, Ferrari e
Jaguar. Um curioso carro para testes de pneus de caminhões em alta
velocidade, o Centipede, era construído em 1972. Usava dois eixos
dianteiros e três traseiros, dois motores V8 na parte posterior e a
suspensão hidropneumática do Citroën DS, que também lhe cedia o estilo
frontal. A evolução dos radiais não parava com o lançamento da gama XZX
e pouco depois a TRX, em 1975. Esse pneu de perfil baixo, adotado como
padrão em vários modelos de alto desempenho, exigia rodas especiais que
não podiam usar pneus de outros tipos ou fabricantes. A medida do aro
era dada em milímetros em vez das habituais polegadas.
Em 1976 a família vendia a maioria das ações da Citroën para a Peugeot,
que criava o grupo PSA Peugeot Citroën. Até essa conclusão de um grande
período para a marca do duplo chevron, certamente foram responsáveis
pelo nascimento de carros importantes como os
Citroëns 2CV,
DS, GS,
SM e
CX. Três anos depois, pneus
da marca triunfavam na Fórmula 1 com Jody Scheckter pilotando o Ferrari
312T4. A Michelin vinha se empenhando por anos em ralis europeus e
provas de turismo e marcas. Também patrocinou equipes do Rali
Paris-Dacar e fez sucesso entre os ciclistas nas provas de velocidade.
Em 1981 assumia o controle do capital do concorrente francês Kleber e
começava a investir nos Estados Unidos comprando a Uniroyal-Goodrich
Tire. Já tinha um centro de pesquisa em Laurens, no estado da Carolina
do Sul, e investia em fábricas nesse grande mercado.
O grupo mostrava ao mundo em 1996 o sistema PAX, que podia rodar a uma
velocidade moderada mesmo após um furo, apoiado em uma estrutura interna
junto à roda. O boneco mudava e se
tornava mais moderno. Em 1998 era comemorado o centenário do Bibendum,
com comemorações em todo o mundo, e acontecia a primeira edição do
Challenge (desafio) Bibendum, competição com carros favoráveis ao meio
ambiente. Quanto ao guia, desde muitos anos já trazia mapas muito
detalhados tanto de cidades quanto de estradas, desenhos e fotos
ilustrativas. Pode-se dizer que foi imitado em vários lugares do
planeta. Em 1999 François Michelin, nascido em 1926, também filho de
Étienne, deixava a direção do grupo. Assumia seu filho Édouard. O pneu
Tweel, de 2004, outra vez revolucionava: não precisava de ar, rodando
com perfeição sobre uma estrutura complexa, mas confiável. No ano
seguinte a marca tornava a ganhar na Fórmula 1 com o Renault R25 V10 nas
mãos do espanhol Fernando Alonso, mas saía da categoria em 2006 por não
aceitar certas regras da Federação Internacional do Automóvel (FIA). No
ano seguinte, em maio, Édouard Michelin morria num acidente de um barco
de pesca na costa da Bretanha, aos 31 anos.
A empresa hoje está espalhada pelo mundo e se instalou no Brasil em
1979, no estado do Rio de Janeiro, fabricando pneus de ônibus e
caminhões. Presente em 19 países, detém 20% do mercado global, ocupa o
segundo lugar no mundo e emprega cerca de 120 mil pessoas. Mantém
centros de pesquisas nos EUA, Espanha, China, Japão e, claro, na França.
Investe muito em física, química, mecânica e é parceira de várias
universidades em território francês. Para proprietários de carros
marcantes como antigos Porsches
911, Ferrari Berlinetta Boxer,
Alpine A310 e Citroën Traction e
DS, mantém uma divisão que faz os pneus originais idênticos aos da época
de forma quase artesanal. Um respeito ao cliente.
Os irmãos empreendedores não tinham mesmo ideia do
potencial que viria a se tornar o nome Michelin.
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