Os boxers de Maranello

Os 365 e 512 Berlinetta Boxer representaram um tempo
de técnica peculiar (e alto desempenho) para a Ferrari

Texto: Fabrício Samahá - Fotos: divulgação

No final da década de 60, um motor V12 era algo tão essencial a um Ferrari quanto o próprio "cavalinho empinado" no emblema da marca fundada em 1947 pelo comendador Enzo. O único carro por ela fabricado com um V6, o Dino, sequer era considerado um Ferrari pelos puristas. Mas as coisas começaram a mudar por causa de Mauro Forghieri, um dos mais competentes engenheiros da empresa.

Forghieri levou a Ferrari a desenvolver um motor boxer de 12 cilindros para competições. Uma medida acertada: nos anos 70 a Ferrari acumularia quatro títulos do Campeonato Mundial de Pilotos e quatro de Construtores na Fórmula 1. Longe de ser uma inovação, já que a Volkswagen, a Porsche e as motocicletas BMW o utilizavam há decênios, o boxer exibia como vantagem básica abaixar o centro de gravidade do carro. Curiosamente, a Ferrari chamava o motor de V12 a 180° -- tecnicamente correto, porém estranho, pois desaparecia a figura da letra V ao se olhar o motor de frente.

Definida a posição central do motor de 12 cilindros, estes modelos em clay foram elaborados para testar soluções de estilo. Como se percebe na foto do alto, um pouco de cada estudo chegou ao modelo final

Em Maranello as soluções desenvolvidas para as pistas não costumam demorar a chegar às ruas. Os benefícios do boxer levaram à definição de seu uso no sucessor do 365 GTB/4 "Daytona". Em vez do V12 dianteiro, haveria agora um motor de 12 cilindros horizontais opostos, montado entreeixos, posição que se esperava ver em um Ferrari desde 1966, quando o fabricante de tratores Ferruccio Lamborghini (leia história) apresentara o inovador Miura.

Embora inevitável, a comparação com o Lambo era o que a Ferrari menos desejava. Como o Miura tinha seu motor central em posição transversal (assim como o Dino), havia uma forte pressão em Maranello para se optasse pela montagem longitudinal. Isso traria um efeito colateral positivo: menor nível de ruído interno, já que o motor como um todo ficaria mais afastado do habitáculo. Com essa decisão em mente, um carro-conceito foi elaborado para o Salão de Turim, na Itália, de 1971.

O carro-conceito apresentado em Turim em 1971: mesmas linhas básicas, mas com apenas quatro lanternas traseiras e saídas de escapamento

Com um entreeixos de apenas 2,49 metros -- entre um Miura e um Chevrolet Corvette, modelos que Enzo desdenhava, mas sabia serem concorrentes --, foi um desafio para os engenheiros da marca fazer caber o enorme boxer sem comprometer a acomodação do motorista e um passageiro, esta uma exigência do comendador. O estúdio Pininfarina já havia desenhado um modelo com banco único central, solução que facilitaria as coisas, mas Enzo Ferrari, um purista, não admitia essa opção.

Em busca de soluções, a Ferrari cogitou de montar o 12-cilindros por cima do transeixo de cinco marchas. Embora pareça absurda, pois um elemento pesado como o motor deve ficar sempre o mais baixo possível para não elevar o centro de gravidade, a idéia se tornava aceitável em vista da pequena altura do boxer. Um sistema de correntes -- montado atrás do motor, assim como a embreagem -- era necessário para transmitir o torque ao transeixo.
Continua

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Data de publicação deste artigo: 30/11/02

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