

Gianni e o presidente italiano
Luigi Einaudi analisam a mecânica do Fiat 600 em 1955; embaixo, o
Ferrari 375 America especial feito para ele



Agnelli em 1976 em uma
publicidade de relógio Omega, em meados dos anos 80 com o irmão Umberto
(centro) e com o filho Edoardo em 2000 |
Gianni gostava de iates e futebol, entendia muito de artes e,
claro, de belos carros.
Em 1952, dirigindo um Fiat esportivo especial, teve um grave
acidente perto de Saint Jean Cap-Ferrat, entre a Provença e a Costa Azul
francesa. Bateu contra um Lancia com violência e ficou seriamente
ferido. Graças à pronta assistência da irmã Susanna, que foi enfermeira
na guerra, as consequências não foram piores. Teve a perna amputada e
passou a usar uma prótese, o que não o impedia de ser um exímio
esquiador. Não se fazia de rogado, pois também adorava velejar e
continuou a dirigir carros esportivos e rápidos. No ano seguinte
casava-se com a princesa Marella Caracciolo di Castagneto. Com muito
charme e glamour, a cerimônia aconteceu no Castelo de Osthoffen, na
região da Alsácia, na França. Em 1954 nascia o primeiro filho, Edoardo Agnelli, e tempos depois a filha Margherita.
Amigos da alta sociedade prestigiavam e promoviam os produtos de Gianni.
Em 1955 ele adquiria um carro muito especial: um Ferrari 375 America
feito especialmente para ele, verde metálico com a estrutura do teto
panorâmico na cor vinho. O vidro traseiro também se abria para baixo.
Por dentro havia muito couro e instrumentação completa. O exemplar único
tinha carroceria desenhada por Battista
Pininfarina, de quem ele também era amigo. Em 1959, outro carro
único chegava a suas mãos: um Ferrari 400 Superamerica com teto
transparente, linhas belíssimas e exclusivas. O playboy de fino gosto
era muito amigo de John e Jackie Kennedy. Sempre transitava muito bem
também nos meios políticos.
Em 1966, aos 45 anos, assumia a presidência do Grupo Fiat — as regras do
conselho, muito rígidas, ditavam a hora de Valleta se aposentar após
excelentes serviços. Ele tinha a seu lado um homem muito competente e de
notável carreira na casa: o projetista Dante Giacosa. Era hora de
responsabilidade para Gianni, mas ele não deixava os prazeres de lado.
Adquiria outro Ferrari único: derivado do modelo
Dino, seu 365 P tinha motor V12,
aerofólio cromado e o banco do motorista no meio da cabine, entre dois
passageiros. A fábrica produzia então os pequenos
500,
600 e
850; os médios
1100 e 1300 e os maiores 1500, 1800, 2100
e 2300. Tinha uma ampla gama, vendia muito bem, mas alguns já
necessitavam de renovação. Gianni frequentava os salões importantes na
Europa e, quando ia à França, estava ao lado do presidente Charles De
Gaulle.
A Fiat se expandia assinando um contrato muito importante com a Vaz, de
Toliatigrad, às margens do Rio Volga, na Rússia. Ali seria produzido por
anos o 124, que viria ao Brasil nos
anos 90 como Lada Laika e também seria produzido na Espanha, na Turquia,
no Marrocos e na Índia. Chegava a década de 1970 e a Fiat já era
proprietária das marcas Ferrari, Alfa Romeo, Lancia, Maserati e
Autobianchi. Dominava o mercado italiano e tinha muito destaque no
europeu. O grupo ainda investia pesado na produção de vinhos famosos e
na hotelaria, era dono dos principais jornais italianos e participava da
restauração de palácios, igrejas e museus. A diversificação era uma
ordem para Gianni, mas tendo como princípio a produção de bons
automóveis.
Nesses anos a Fiat enfrentava a crise do petróleo e
problemas com os sindicatos fortes do país. Com mão firme e cabeça no
lugar, soube vencer os desafios como um empresário forte e decidido.
Conversava e argumentava com muita propriedade tanto com Enzo Ferrari
quanto com Henry Kissinger.
O 127 de 1971 adotava o conceito do
Mini inglês — um carro pequeno com
motor transversal e tração dianteira — e representou uma guinada de
sucesso para o futuro, que fez escola e preencheu as ruas do mundo. Como
bom propagandista de seus produtos, Gianni dirigia um 127 pelo difícil
trânsito de Roma. Tinha hábitos refinados, mas também era simples... e
às vezes muito extravagante. Usava o relógio de pulso preso à manga da
camisa, sem contato direto com o corpo. Foi um dos motivos de se tornar
"garoto- propaganda" da Omega, famosa marca de relógios suíços.
Veio ao
Brasil em 1976 para inaugurar a fábrica de Betim, na região
metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais. Ele e o presidente
Ernesto Geisel hastearam as bandeiras da Itália e do Brasil, marcando o
início da produção do compacto 147,
que originou uma grande família e fez história. Conhecido na Itália como
l’Avvocato, ou seja, o Advogado, foi nomeado senador em 1991. Seguia a
tendência política de seus ancestrais. Infelizmente, a saga de
fatalidades familiares continuava: em 1997 perdia o sobrinho Giovanni
Agnelli, cujo apelido era Giovannino. O filho de seu irmão Umberto tinha
um raro câncer e apenas 33 anos. Três anos depois, mais um ferimento
terrível para a família: seu filho Edoardo cometia suicídio.
No dia 24 de janeiro de 2003, morria também de câncer um homem que soube
viver muito bem os prazeres da vida, assim como ser um dos empresários
mais bem-sucedidos por 30 anos à frente de um dos maiores conglomerados
do mundo. Junto com a família, contribuiu fortemente para colocar a
Itália como um país próspero e respeitado por sua economia. No mesmo ano
a escuderia Ferrari de Fórmula 1, em reverência a esse homem tenaz
comparado a um chefe de estado, batizou um de seus modelos de
pista como F2003-GA. Uma justa homenagem.
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