O DKW sempre teve vocação esportiva, aqui e no mundo todo. A
fábrica em Ingosltadt tinha uma política de apoio e incentivo a
pilotos que corressem de DKW em pista e em rali, em âmbito
mundial, inclusive o direito a comprar peças com desconto. Mas
equipe de competição, na acepção verdadeira da palavra, só a Vemag
teve. Como é sabido, a presença de uma equipe de fábrica em
corridas de automóveis tem a finalidade de enaltecer e provar as
qualidades da marca. Nisso a equipe Vemag teve êxito absoluto.
O alemão Karl Iwers, de Porto Alegre, que importava DKW antes e
depois da Segunda Guerra Mundial, já corria com o carro em seu
estado. Chegou a participar da primeira Mil Milhas Brasileiras, em
1956, com um F91. Com o início da produção do DKW no Brasil, sua
nomeação como concessionário Vemag foi praticamente automática. Um
F91 e outro F93, obviamente importados, começaram a correr em São
Paulo em 1957-1958, inclusive nas Mil Milhas que se seguiram. Seus
donos eram ninguém menos que os pilotos Eugênio Martins e Mário
César "Marinho" de Camargo Filho, na ordem. "Marinho"
(foto) logo
brilharia como piloto de DKW.
Mas foi a chegada do modelo F94 de quatro portas, em 1958, que fez
o curioso carro de motor a dois tempos entrar em massa nas pistas.
Naquela época o único autódromo brasileiro era o de Interlagos, em
São Paulo, e por isso se corria muito em circuitos de rua como os
do interior de São Paulo, em Piracicaba, Araraquara, Piraju e até
em Poços de Caldas, em Minas Gerais. No Rio de Janeiro corria-se
na Barra da Tijuca e na cidade de Petrópolis, na serra fluminense.
No Rio Grande do Sul havia provas em várias cidades, Porto Alegre
inclusive. As corridas de carros de turismo haviam tido grande
impulso desde a Mil Milhas e começaram a se multiplicar.
O principal, senão único, rival do DKW era o Volkswagen 1200,
prestes a começar a ser fabricado no Brasil, mas também havia
carros europeus importados na década de 1950, como Fiat 1100 (Millecento),
Citroën 11,
Volvo PV444 e
Borgward Isabella. O DKW logo se
destacou diante da concorrência. A desordem do automobilismo
daqueles anos possibilitava misturar os carros de turismo como os
de grã-turismo, como Porsche 356
e Alfa Romeo Giulietta.
Em 1959 chegaram o Simca Chambord e o
Renault Dauphine, que
logo foram para as pistas também, acompanhados no ano seguinte
pelo FNM 2000 JK.
Esses carros de turismo e GTs corriam tanto nas ruas como no
autódromo de Interlagos. Os DKWs, mais numerosos e mais bem
preparados — era fácil aumentar a potência dos motores dois-tempos
—, começaram a se destacar cada vez mais. Mostravam ótimo
desempenho em provas como a Mil Milhas, embora sempre
apresentassem problema de durabilidade em provas longas. Mas
enquanto andavam — e como andavam! — estavam sempre entre os
ponteiros.
O DKW na pista fazia um barulho estridente, ao mesmo tempo
corpulento e ensurdecedor, bem diferente dos demais carros. A
Vemag havia formado uma equipe de fábrica que estreara na Mil
Milhas de 1959 com três carros, com Marinho em um deles em dupla
com Eduardo Scuracchio. Já correram com o motor de 1.000 cm3,
então novidade, pois até então eram de 900 cm3. Havia DKW em
grande quantidade, mas os da equipe da fábrica eram mesmo um show
à parte com sua pintura branca. Havia nessa corrida um carro não
de fábrica, muito rápido, preparado pela concessionária Vemag
Serva Ribeiro. Mas não agüentou. A melhor colocação da marca foi
terceiro, conseguida por uma dupla independente, Caio Ferreira e
Lauro Bezerra.
Na Mil Milhas de 1961 o DKW n° 10, da fábrica, fechou a primeira
volta em primeiro, um feito extraordinário levando em conta que
havia carros realmente muito potentes — como certos carreteras com
motor Corvette de pelo
menos 4,5 litros — e um nacional de bom conjunto mecânico, o JK,
além do Simca. Estas duas marcas também haviam formado equipes
oficiais. Nesse ano a Vemag contratou Bird Clemente, um grande
reforço para a equipe. Foi o carro de Marinho e Bird que passou em
primeiro ao fim da primeira volta. O motor de 1,1 litro
desenvolvia 103 cv. |
Essa virada 1959/1960 e os primeiros anos da nova década foram o
grande momento do DKW nas pistas, sobretudo nos circuitos de rua,
onde eram imbatíveis. O sossego acabaria quando a Willys-Overland
começou a produzir em 1961 o
Interlagos, que foi
para pista logo no ano seguinte em equipe comandada pelo piloto
Christian Heins, que também chefiava a produção do carro. A versão
berlineta, muito leve e baixa, com motor 1,0-litro de cerca de 70
cv, deixava o pesado e alto DKW para trás, em especial em
Interlagos.

Em meados de 1963 Jorge
Lettry, o gerente de competições da Vemag, viu que precisaria de
outro carro para enfrentar o Interlagos. A solução veio em 1964
com o GT Malzoni (leia história),
produzido a partir da plataforma do DKW por Rino Malzoni em Matão, SP. Ainda um protótipo em chapa de aço, mostrava
grande potencial. A versão definitiva, com carroceria em plástico
reforçado com fibra-de-vidro, ficou pronta no fim do ano e em 1965
a Equipe Vemag tinha três GTs Malzoni, com os quais venceu muito
na classificação geral.
A concorrência contra-atacou com o Mark I 1300, da Willys, e pouco
depois com o Simca-Abarth 2000.
Esses carros faziam séria oposição ao GT Malzoni e logo entraria
outro muito rápido, o Karmann-Ghia-Porsche da concessionária VW
Dacon, de São Paulo. Com motor de 2,0 litros e duplo comando, era
muito rápido nas mãos de José Carlos Pace e outros pilotos. A essa
altura Bird Clemente já era piloto da Willys.
O ocaso da Equipe Vemag ocorreu
em 1966. Já havia sérios rumores de que a empresa estava sendo
vendida para a VW, o que ocorreria em agosto. Um mês antes
o departamento de competições fechara para sempre, mas antes a Vemag se apresentou na singular competição de quilômetro lançado
com o Carcará (leia boxe).
O GT Malzoni faria uma espetacular aparição na Mil Milhas de 1966,
quando a Vemag emprestou os três carros, motores e câmbios da
equipe que havia fechado para os pilotos que haviam sido da equipe
e outros. Quase venceu a corrida o GT de Emerson Fittipaldi e Jan
Balder, prejudicado por um pequeno problema de ignição bem perto
do fim. Acabou vencendo o carretera Corvette de Camillo
Christófaro e Eduardo Celidônio, seguido dos três Malzonis:
"Marinho"/Eduardo Scuracchio, Fittipaldi/Balder e Norman Casari/Carlos
Erimá. Teria mesmo sido um fecho de ouro para a participação do
DKW nas pistas, ainda que "enroupado" com uma carroceria diferente
da original.
O DKW ainda continuou nas pistas por mais dois anos, mas sem o
brilho de antes. Apenas Casari, que residia no Rio e havia
comprado um dos Malzonis da equipe, conseguiu algum sucesso nas
provas do campeonato carioca. O berro inconfundível e exuberante
do motor dois-tempos passava para a história.
Bob Sharp |