Nesta quarta-feira, 19, comemoraram-se 40 anos do lançamento do
Opala, o primeiro automóvel
fabricado no Brasil pela General Motors. Produzido até 1992 em uma
única geração, que foi reestilizada várias vezes, o grande sedã é
certamente um marco de nossa indústria que nunca será esquecido,
como comprovam suas vitórias em categorias de carros fora de linha
em todas as edições da Eleição dos Melhores Carros do Best
Cars.
O Opala representou para a GM o começo de um ciclo que atingiria seu
ponto alto na década de 1990, para então começar a despencar. Não me
refiro a números de vendas ou de lucros, que refletem mais o momento
da economia do País que a excelência dos produtos de uma empresa: o
fato é que, do ponto de vista de quem gosta de automóvel, a GM hoje
vive do passado.
Exagero? Vamos voltar um pouco no tempo. Quando o Opala estreou, em
1968, estava atualizado ao Opel
Rekord então produzido na Europa — ainda que eles usassem
mecânicas diferentes, tendo a GM daqui escolhido motores de origem
americana. Cinco anos mais tarde veio o
Chevette, lançado no
Brasil meses antes do similar alemão, o Opel Kadett C, e com
mecânica semelhante à usada do outro lado do Atlântico. Apesar de
não ter acompanhado as reformulações do Rekord, que já em 1972
passava a uma nova geração, a subsidiária brasileira voltaria a
brilhar em 1982 com mais um expressivo modelo de sua história.
O Monza chegava em plena
sintonia com o alemão Ascona
de terceira geração, que os europeus conheciam havia poucos meses.
Não só era moderno na aparência, mas também na mecânica, com um
motor tão atualizado que era exportado daqui para outras divisões da
GM em países mais desenvolvidos. O êxito do Monza, coroado por três
anos de liderança de vendas no mercado — surpreendentes para um
carro médio, longe de ser barato —, tem ligação inegável com o
progresso técnico que ele trouxe à marca e com os atributos que ele
oferecia ao consumidor.
Dali em diante a evolução se tornou mais lenta, mas persistiu. O
Kadett desembarcou por aqui
em 1989, cinco anos atrasado em relação ao europeu, mas ainda
representou passo importante no segmento e no mercado como um todo —
era nosso primeiro novo carro desde o Uno, de 1984. No ano seguinte
o País abria as fronteiras aos importados, mas a GM trabalhava em
mais um grande automóvel que marcaria sua trajetória.
Apresentado em 1992, o Omega foi para muitos o melhor carro que
nossa indústria produziu até hoje. Ainda que lançado aqui seis anos
depois do similar alemão, representou a única opção nacional
competitiva com modelos de luxo importados, feito notável a um tempo
em que importar se tornava mais viável que fazer aqui esse tipo de
veículo, pelo baixo volume de produção. Quando ele saiu do mercado,
em 1998, foi-se nosso último automóvel com motor
de seis cilindros (haveria em 2003 apenas uma série limitada do Golf
com um V6) e tração traseira. Deixou saudades.
A defasagem com a Europa voltou a ser pequena com o Corsa de 1994
(um ano atrás dos alemães) e o Vectra de segunda geração, em 1996,
outro símbolo de modernidade da GM no mercado. Apenas seis meses
depois da estréia no Salão de Frankfurt, o médio de Primeiro Mundo
passava a ser fabricado aqui. Dois anos depois vinha o Astra, também
atualizado com o europeu de 1997, embora já começasse a transparecer
que por baixo das novas carrocerias a GM local mantinha motores algo
defasados, da mesma linha iniciada 16 anos antes com o Monza. |
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O presente
O primeiro passo em falso da GM, do ponto de vista de quem
aprecia bons automóveis, deu-se em 2000 com o resultado do projeto
Arara-Azul: o Celta. Quem esteve no lançamento à imprensa no Rio
Grande do Sul, como este editor, ainda se lembra de duas decepções.
Uma ao entrar no carro e perceber o que ele era: o conhecido Corsa
de 1994, maquiado por novas linhas e despojado por todos os lados
para redução de custos — ao extremo de não ser possível virar os
pára-sóis para as laterais. Como ouvi de um amigo na época,
"percebemos como o Corsa Wind era um carrão...". A outra decepção,
quando o preço foi anunciado, pouco abaixo do Wind e bem acima da
expectativa do mercado, apesar de toda a "depenação" e do sistema
produtivo enxuto em Gravataí, RS. Era um excelente negócio... para a
GM, claro.
Do Celta para cá, houve alguns acertos e uma sucessão de erros. A
segunda geração nacional do Corsa, de 2002, era um bom projeto e
chegou relativamente atualizada com a Europa, mas com dois
problemas: um motor 1,0-litro de desempenho insatisfatório e um 1,8
de alto consumo e preço elevado. O interessante produto "patinou" no
mercado por cinco anos — a ponto de a GM por muito tempo divulgar
suas vendas acopladas às do Classic, o Corsa anterior, para inflar
os números — até receber um motor mais eficiente, de 1,4 litro, e
ter o preço reduzido.
Também daquele período são as minivans Meriva e Zafira, que até hoje
padecem das mesmas deficiências: desempenho de menos e consumo
demais, resultado da baixa tecnologia dos motores e, no primeiro
caso, do excesso de peso para seu porte. E, quando resolvia aplicar
algum desenvolvimento aos velhos propulsores, a GM caía em erros
como o primeiro VHC, famoso pelos problemas crônicos em pistões e
pela facilidade com que apresentava
detonação — um dos recordistas de reclamações do Canal Direto
por essas duas razões.
Em 2005, depois de anos esquecido pelo fabricante, o segundo Vectra
deixava o mercado. A GM anunciava que ele teria um sucessor
desenvolvido no Brasil, sob alegação de que o volume de vendas não
comportava a produção local do similar alemão, reformulado três anos
antes. Quando o modelo foi apresentado, nova decepção: a nova
carroceria, baseada na do Astra alemão, "vestia" uma mecânica
superada, que combinava as suspensões do Astra de 1998 a motores
derivados do Monza de 23 anos passados. De fato, é como Astra Sedan
que ele seria vendido em países menos desenvolvidos do leste europeu
— onde não se aceitaria a "promoção" a Vectra —, mas a versão feita
na Polônia usa os motores mais modernos da Opel. E quem dirigia o
novo Vectra sentia saudades da excelência de projeto do modelo
antigo, sobretudo no compromisso da suspensão entre conforto e
comportamento.
A trajetória de declínio seguia. Em 2006, um mega-evento revelava a
suposta "nova geração" do Celta, nada mais que uma reestilização
parcial e a — há muito necessária — reforma do interior, afinal mais
próximo do que o Corsa Wind oferecia. Muita pompa para pouca, ou
nenhuma, circunstância. Meses depois vinha o Celta sedã, ou Prisma,
derivado do hatch de seis anos antes, por sua vez uma variação do
Corsa de 1994. Mais uma vez, a GM se propôs a substituir um
competente modelo dos anos 90 com uma nova embalagem e retrocessos
técnicos, sem qualquer benefício ao consumidor. Com o Vectra hatch,
em 2007, o ciclo de renovar na aparência sem evoluir se completou.
Enquanto alguns mudaram sem progredir, Astra, Zafira, S10, Blazer
ficaram estacionados, simplesmente deixaram o tempo passar.
Quarenta anos depois do Opala, a GM brasileira não deixa dúvidas de
que o ápice de sua história ficou no passado. A linha atual é uma
das mais defasadas do mercado, a gama de motores tem mais de 25
anos, o padrão de acabamento e as qualidades de rodagem andaram para
trás na última década. Aquele grande automóvel que apareceu em 19 de
novembro de 1968 estaria desapontado com os rumos tomados por seus
descendentes depois que ele nos deixou. |
Ao
conhecer o Celta, duas decepções: uma ao entrar no carro, outra
quando o preço foi anunciado — pouco abaixo do Wind e bem acima da
expectativa do mercado |