O que pode haver em comum entre o desenho de um televisor e o de um
carro? Talvez o fato de serem do mesmo projetista. Se for essa a
resposta, é muito provável que o autor de ambos seja Philippe
Charbonneaux, um dos poucos desenhistas que conseguiu sucesso projetando
tipos tão diferentes de bens.
Se os televisores atuais, muito finos e quase totalmente ocupados pelas
telas, não permitem a inserção de elementos de estilo encontrados em
veículos, os aparelhos das décadas de 1950 e 1960, com grandes gabinetes
e telas minúsculas, permitiam essa ousadia, bem aproveitada por
Charbonneaux em seus futurísticos aparelhos de TV. E ele também seguia o
caminho inverso, com parte dos elementos de estilo dos televisores sendo
adotados em seus veículos.
Philippe Charbonneaux nasceu em 18 de fevereiro de 1917 em Reims,
França. Seu pai era um importante agricultor, conhecido por seu papel
pioneiro na industrialização de produtos agrícolas. Na escola, Philippe
passava seu tempo desenhando aviões na classe, com uma paixão precoce
pela aviação. Depois de fazer um curso de idiomas na Inglaterra, prestou
o serviço militar na Força Aérea de seu país, onde recebeu a tarefa de
traduzir manuais de pilotagem e de manutenção de aeronaves.
Em seu tempo de lazer desenhava carros, sua outra paixão, e enviava os
desenhos a grandes encarroçadores parisienses da época, como Franay,
Figoni & Falaschi e Saoutchick. Durante a Segunda Guerra Mundial, depois
de outra viagem à Inglaterra — onde trabalhou como tradutor — e de uma
missão no Marrocos, ele retornou a Reims. Observador atento da força
aérea alemã, informava às autoridades francesas das novidades que havia
observado nas esquadras inimigas. Ocupava seu tempo livre fazendo
pinturas a guache das aeronaves envolvidas no conflito.
Após o fim da guerra, seus desenhos eram ilustrados com frequência nas
capas das revistas Science et Vie, L'Equipement
Automobile e Le Monde Illustré, entre outras. Com
certa notoriedade por suas capas de revista, a Charbonneaux foi confiada
em 1947 a elaboração das ilustrações de promoção de vendas da
Delahaye. Logo também estava
ilustrando os catálogos da Delage.
Um ano depois ele cruzava um marco em sua carreira, quando a Delahaye
lhe delegou a modernização do estilo de seus carros. Com talento,
definiu a silhueta do modelo 235, integrando para-lamas e faróis de
maneira incomum. O protótipo foi construído na Itália pela encarroçadora
Motto. Uma versão esporte, chamada Grand Prix, também foi desenhada por
ele.
No ano anterior, Charbonneaux havia sido procurado pelo piloto Jean
Pierre Wimille para desenhar a carroceria de um carro que ele planejava
produzir em pequena série. A especificação era, ao mesmo tempo, simples
e inovadora. O carro deveria ser leve e rápido, com o diferencial de
oferecer três lugares em linha — com o motorista no centro e um pouco
mais adiante, como se veria quatro décadas depois no
McLaren F1 — e motor em posição
central. A aerodinâmica era um elemento importante do estudo.
O carro de Wimille causou sensação no Salão de Paris, em outubro de
1948. Alguns destaques do desenho eram a parte superior em formato
aproximado de gota, as portas entrando pelo teto e aletas onde
normalmente ficaria o vidro traseiro. Mas a morte de Jean Pierre durante
teste para o Grande Prêmio da Argentina, em 28 de janeiro de 1949,
encerrou o projeto.

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