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Um simples adesivo

Querem substituir a formação correta do motorista e a
fiscalização dos motociclistas por um pedaço de plástico

por Fabrício Samahá

Fabrício Samahá, editorNão é de hoje que adesivos ilustram a personalidade do motorista. Do curioso "Já fui assaltado!" distribuído por uma rádio, que parecia pedir aos meliantes que escolhessem uma vítima com a carteira mais cheia, às marcas de acessórios e itens de preparação aplicadas às portas dos carros "tunados", ao estilo Velozes e Furiosos, muito do que pensa o dono de um carro pode ser dito ao mundo por esses pedaços de plástico.

A questão se complica, no entanto, quando os adesivos — ou outras formas de gravação e identificação — se tornam pseudo-soluções, em geral impensadas, para problemas que não se resolvem com tanta simplicidade.

Lembra-se o leitor do selo-pedágio, que permitia o trânsito do veículo em rodovias por um preço mensal único? Cobrava-se o mesmo valor de quem usava a estrada todos os dias e de quem o fazia uma vez por mês — o exato oposto do que se pode considerar uma tributação justa. Depois, em 1997, surgiu o selo de licenciamento, aplicado ao pára-brisa para facilitar a fiscalização. Não se sabe se seu fim precoce, logo no ano seguinte, teve relação com a cola, terrível de remover. Sei de carros que o têm até hoje.

Agora é a vez de dois outros adesivos. Um, com o número da placa da motocicleta e aplicado ao capacete do piloto, é um projeto de lei arquivado em janeiro de 2003 e reapresentado em setembro pelo senador Magno Malta (PL-ES). Outro projeto, proposto pelo deputado Carlos Rodrigues (PL-RJ), prevê que todo motorista com até um ano de habilitação ostente, no pára-brisa e no vidro traseiro, a frase "Atenção, motorista recém-habilitado". O adesivo seria entregue junto com a habilitação.

Mais uma vez, como comentado no Editorial O poder da canetada, nossos legisladores demonstram alienação dos verdadeiros problemas do País.

No caso das motos, qual a razão para criar uma nova identificação? Elas podem perfeitamente ser identificadas pela placa, cabendo à fiscalização garantir que esta permaneça visível e sem adulteração. O site do senador alega que "no caso de utilizarem veículos roubados, estará estampado nos capacetes a diferença com a placa veicular, o que facilitará o trabalho fiscalizatório". Bobagem: quem assalta um motociclista pode levar também o capacete.

Na questão do motorista recém-habilitado, o debate vai além. Tal indicação é típica do “ouviu o galo cantar mas não sabe onde”. Em muitos países o motorista novato é obrigado a ostentar no veículo tal informação por período que varia de um a dois anos — como a Permissão para Dirigir válida por um ano daqui. Mas jamais uma longa frase nos vidros, e sim uma letra aplicada à traseira mediante adesivo.

A letra, que no Brasil poderia ser “P” (Permissão), serve para informar aos policiais que ali vai um motorista nessa condição, e não a quem está dirigindo outros veículos. Isso porque quem recebeu apenas a permissão tem certas restrições. Por exemplo, não exceder 90 km/h (França e Portugal), alcoolemia zero (Nova Zelândia), carros com relação peso-potência igual ou superior a 20 kg/cv (Itália) e não dirigir entre 22h e 5h sem acompanhamento de um adulto (Nova Zelândia).

À parte o que se aprende com o tempo, todo o restante da qualificação de um bom motorista deve estar incutido nele desde o primeiro dia ao volante. E é isso que falta à formação do motorista brasileiro. Mesmo com todo o aumento de carga horária, de burocracia e de custos promovido pelo Código de Trânsito Brasileiro de 1998, mesmo com o pomposo nome de Centro de Formação de Condutores atribuído às antigas auto-escolas, a verdade é que não se aprende a dirigir no País: aprende-se a passar no exame para obter a habilitação.

Identificar os iniciantes sem um propósito objetivo nada vai resolver. O que fará efeito é aprimorar a instrução, ensinar como funciona o automóvel e ministrar aulas de direção também à noite e em rodovias de alta velocidade, para que o motorista seja realmente preparado para o que vai enfrentar mais tarde.

Os problemas estão aí. Resolvê-los requer mais do que um simples adesivo.

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Data de publicação: 15/5/04

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