

Solidez e resistência apregoadas
na publicidade não se confirmavam na prática; embaixo o "Bernardão", o
Jeep alongado de quatro portas |
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Sem êxito nos EUA, o sedã Aero
Willys encontrou adequação no Brasil; em 1963 ganhava linhas mais
imponentes (embaixo), de projeto local |
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Joseph Frazer saiu do negócio, e os Kaisers, acostumados a fazer muitos
lucros mais rápidos — aço, construções —, não deram o braço a torcer,
optando por resumir a operação, olhar para o mercado externo. Rápido,
Edgar Kaiser, herdeiro, marcou viagem à América do Sul. Passo definidor.
No Rio de Janeiro, após anunciar os planos num jantar, ouviu do
Chanceler Oswaldo Aranha — pai do seu representante — que nenhuma das
empresas de automóveis aqui instaladas, incluindo a General Motors,
prestava serviços ao País, sem desenvolver uma indústria. Fosse pelo
peso institucional de Aranha, ex-embaixador nos EUA, com livre trânsito
no país, referenciado mundialmente como o brasileiro que abriu a
primeira conferência da ONU, outra consequência do pós-guerra; fosse
pela situação e números, por dossiê de Hickman Price, então seu
funcionário, pelo champanhe que dá coragem, Kaiser respondeu à altura:
fazer 50 mil por ano, para vendê-los a US$ 2 mil, ao mercado interno e
de exportação. E completou: com 30% de peças nacionais.
Demorou, atrapalhado pelo suicídio de Vargas. Meses após, Edgar Kaiser
veio para os finalmente, decidindo a operação em São Paulo, onde mais
crescia a indústria de autopeças. E sobrevoando fazendas em São Bernardo
do Campo, SP, seu piloto particular sugeriu um platô, perto de duas
estradas ligando com a capital, uma com o porto, para iniciar sua
fábrica. Objetivo, Kaiser nomeou-o diretor, fiscal pessoal do
empreendimento. Seu nome era William Max Pearce; era engenheiro e piloto
de caça na recém-encerrada Guerra da Coreia.
Começa
É a terceira
fase. A Willys não perdeu tempo. Manteve importação, montagem e
distribuição a partir do Rio de Janeiro e, em paralelo, construiu amplo
prédio onde instalou a linha de montagem que abrigava o restaurante
industrial para funcionários. Orgulhava-se: no fim de 1954, cumpria a
promessa de 30% das peças do Jeep Universal serem nacionais.
O "Barracão", como chamara o que orgulhosamente no Brasil se denominava
"A Pioneira", era prédio simplório, visível da Estrada do Vergueiro,
ligando o bairro do Ipiranga ao Caminho do Mar — ainda não havia a Via
Anchieta —, e apresentava enorme logomarca em neon: Jeep. O
prédio existe. É o galpão 4 na grande estrutura industrial hoje operada
pela Ford.
Para viabilizar fluxo e controle industrial, Price logo comprou a
fundição da Máquinas Piratininga, em Taubaté, SP, e, além de caixas de
marchas e transmissões, em 1958 desmentiu teoria de engenheiros
norte-americanos, do ser impossível vazar — fundir, fazer — motores no
Brasil, pois o clima tropical não daria bom comportamento mecânico aos
metais. Foi o primeiro motor a gasolina feito localmente. Price, bom de
serviço, foi para a Mercedes-Benz ser presidente e, logo após, levado
aos EUA, ministro do governo Kennedy.
Saiu Price, ficou Pearce com maiores poderes. Dinamizou o negócio por
conta da favorabilidade das condições, em especial ter os meios
industriais, autonomia, geração local do fluxo de caixa — e os produtos
mais adequados ao Brasil daquele tempo: Jeep, logo a Rural, o grande
salto de nacionalização com motor próprio, três anos antes dos
concorrentes, picape Jeep. O motor BF-161, com válvulas em "F" —
admissão no cabeçote e escapamento no bloco —, foi desenvolvido para
tocar geradores de luz, ser motor auxiliar, mover barcos. O do
Dauphine, abaixo citado,
também.
Retrato do País, acredite, o Jeep foi durante alguns anos o veículo mais
vendido. Em 1959, passo grande e valente, associada à Renault, entrou no
caminho dos automóveis, indo ao outro extremo da escala da resistência,
construindo pequeno sedã Dauphine — e dinamizou aproximar frágeis
europeus da inimaginável realidade brasileira da ausência de asfalto,
estradas, gasolina ruim, mecânicos desinformados...
Manteve a direção o sedã Aero-Willys,
em 1955 descontinuado nos EUA pois, pelo gosto dos compradores de lá,
relativamente aos concorrentes Ford, Chrysler, Chevrolet, era pequeno,
com motor idem — o seis-cilindros de 2,6 litros e 90 cv —, tinha rolar
áspero. Mudou a escrita. Nem tudo que não é bom para os EUA é ruim para
o Brasil. Aqui o Aero foi sucesso por suas dimensões, equilíbrio entre
consumo e rendimento, bom torque em baixas rotações no motor,
resistência.
Atrevimento
Pearce manteve visão,
agilidade, rapidez e coragem para agir, criando fatos para conseguir
resultados. Adequou a fábrica para produzir o Gordini, evolução do
Dauphine, mantendo o motor de quatro cilindros traseiro de 850 cm³,
evoluído para 40 cv, e câmbio de quatro marchas em vez do pioneiro de
31,5 cv e três marchas. Adquiriu à francesa Alpine pequena fábrica de
carros esportivos com mecânica do Gordini, direitos de produção e
transmissão de tecnologia para construir o esportivo aqui chamado
Interlagos, feito em versões
Berlinette, Coupé e Conversível.

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