O projeto original de Marcello
Gandini (em cima), com um vidro traseiro amplo, e duas fases do desenho
depois que a Chrysler decidiu retocá-lo
O Diablo chega às ruas em junho
de 1990: linhas ameaçadoras, cabine avançada, portas "lâminas de
tesoura", mais de dois metros de largura |
Desde que o fabricante de tratores italiano
Ferruccio Lamborghini
decidiu produzir automóveis, seus modelos esporte têm ocupado posições
de destaque entre os carros mais marcantes da classe em cada década. Nos
anos 60 esse título é disputado com empenho pelo
Miura, lançado em 1966. Nas duas
décadas seguintes, o Countach
de 1974 representou um sonho de consumo estampado nas paredes dos
quartos de adolescentes pelo mundo afora. Não poderia faltar um
Lamborghini especial também nos anos 90. Com produção iniciada há 20
anos, em junho de 1990, ele se chamava Diablo.
O projeto 132, destinado a suceder ao longevo Countach, teve início em
junho de 1985 durante o período em que a fábrica esteve sob controle dos
irmãos suíços Mimram. O italiano
Marcello Gandini, autor
tanto do Miura quanto do Countach, foi contratado para desenhar o novo
superesportivo, que tinha como meta uma velocidade máxima de 315 km/h ou
superior. Com a absorção da Lamborghini pela norte-americana Chrysler,
em 1987, o projeto ganhou os recursos necessários. O desenho anguloso de
Gandini foi entregue aos projetistas da nova proprietária para ser
retocado, o que acrescentou algumas curvas e, ao que consta, deixou o
italiano um tanto decepcionado.
Em 21 de janeiro de 1990 era apresentado em Monte Carlo, no Principado
de Mônaco, o carro que daria seguimento à tradição de superesportivos da
marca de Sant'Agata Bolognese. O nome Diablo, que significa diabo em
espanhol, veio de um touro feroz pertencente ao Duque de Veragua no
século XIX — os novos donos da marca respeitaram o hábito de Ferruccio,
que vendera a empresa ainda nos anos 70, de usar denominações associadas
a touros de briga. Como seu antecessor, o carro causou sensação. Ainda
que suavizados pela Chrysler, os traços fortes característicos de
Gandini estavam bem presentes na carroceria longa (4,46 metros),
extremamente larga (2,04 m, a maior em um carro à venda na Europa na
época) e muito baixa (1,10 m) do Diablo, que media 2,65 m na distância
entre eixos.
O aspecto mais marcante do desenho era a cabine avançada, como que
debruçada sobre o eixo dianteiro — inspirada nos carros de competição do
Grupo C da época —, a tal ponto que o recorte anterior das portas
acompanhava a curvatura da caixa de roda. O para-brisa muito amplo (e
com um só limpador) repetia a inclinação do pequeno capô frontal,
enquanto uma linha quase reta seguia do topo do teto até o fim da
carroceria. A frente usava faróis escamoteáveis e quatro unidades
auxiliares no para-choque, que vinha bem integrado ao estilo. Grandes
tomadas de ar nas laterais, tanto atrás das janelas quanto na parte
inferior, deixavam claro que o vigoroso motor estava ali, depois da
cabine.
Visto por trás ele ostentava lanternas circulares, quatro
imponentes saídas de escapamento e saídas de ar na cobertura do motor. O
vidro traseiro, vertical e diminuto, não favorecia a visibilidade, mas
os das portas contavam com uma ponta dianteira que melhorava a visão
pelos retrovisores. O esboço original previa um vidro traseiro
inclinado, acompanhando as laterais, mas a solução teria sido abandonada
por dificuldades de arrefecimento do motor. E, claro, estavam presentes as portas que se abriam para frente e para cima,
como lâminas de tesoura, agora com vidros inteiriços, descendentes e
dotados de comando elétrico. Além do charme que até hoje leva o segmento
de personalização a fazer imitações, tais portas se justificavam pela
escassez de espaço nas laterais em qualquer vaga convencional, diante da
exagerada largura do carro.
A estrutura usava alumínio
de alta resistência na célula ao redor da cabine, enquanto a frente e a
traseira faziam uso do mesmo material com menor resistência para
produzir deformação — e absorver energia — em impactos. O alumínio
também predominava na carroceria, mas frente, traseira e cobertura do
motor eram feitas de compósitos. O coeficiente
aerodinâmico (Cx) de 0,31 indicava um projeto cuidadoso —
supercarros não costumam ser expoentes nesse aspecto pela necessidade de
muitas tomadas de ar e de reduzir a
sustentação.
Apesar das dimensões externas, o Diablo não era um carro espaçoso por
dentro, onde dois adultos sentavam-se baixos nos bancos revestidos de
couro e não dispunham de grande conforto. À frente do motorista vinham
um painel bastante volumoso com seis instrumentos e o volante de três raios, também de
couro, ajustável em altura e distância e com o logotipo do touro bravo.
O quadro de mostradores acompanhava o ajuste de altura do volante. Aparelho de áudio Alpine (com toca-fitas ou toca-CDs, além
da opção de disqueteira remota), alguns comandos e a alavanca de câmbio
— com uma "grelha" para facilitar o engate — estavam em um console alto.
Apesar do revestimento em couro, não era um carro sofisticado e havia
queixas à qualidade de alguns materiais. Entre os opcionais
vinham relógio Breguet no painel, banco do motorista sob medida para
o comprador, malas feitas para o espaço disponível (de 140 litros) e aerofólio traseiro.
Continua
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