

O estepe do sedã passava para o
porta-malas, que se tornava saliente; o maior entre-eixos e
o motor mais potente, 150 cv, saíam do catálogo


A grade à altura dos faróis, com
um complemento em cima, distinguia o último ano-modelo do carro mais
avançado que a Chrysler já produziu |
As
saídas de ar nas laterais do capô formavam duas faixas, assim como os
frisos duplos que acentuavam a linha da cintura sob as janelas na
lateral. O estepe foi parar dentro do porta-malas, que agora tinha
abertura por fora, num novo ressalto da traseira. Por dentro os
instrumentos tinham formato quadrado. O motor de 150 cv e o
entre-eixos de 3,71 metros já não eram mais oferecidos. Nesse ano a
Lincoln lançou outro modelo da tendência streamline, o menos radical,
mas mais bem-sucedido Zephyr. Somente
6.274 Chryslers e 5.000 DeSotos Airflows foram vendidos em 1936, fazendo
a empresa decidir aposentar o DeSoto. O modelo Chrysler duraria só mais
um ano-modelo.
Com um desenho de grade na altura dos faróis e uma continuação bipartida
acima dela, o fabricante conseguiu distinguir o Airflow 1937. Mais que
isso, ela estava num ressalto da dianteira que fazia pensar num nariz.
Os faróis simples, mas numa base em forma oval com respiros logo abaixo
das lentes, lembravam o do modelo DeSoto de 1934. O desenho dos
para-choques e as saídas de ar nas laterais do capô também estava
diferente. Em seu último ano, reduzido à versão Eight, o Airflow teve
4.600 compradores. O estilo — sempre ele — era a justificativa mais
recorrente para o fracasso comercial do Airflow: o desenho de sua
carroceria seria ousado demais para a época. Há de se considerar também
que a pressa de finalizar o projeto acabou cobrando seu preço no início.
Contudo, mais que encontrar razões para sua curta trajetória, deve-se
reconhecer seu poder de influência na história do automóvel.
Em poucos anos todos os carros teriam contornos arredondados, parecidos
com os seus, e faróis e para-lamas embutidos como os seus para resistir
menos ao ar enquanto trafegavam (leia
boxe). O habitáculo entre os eixos foi outra tendência lançada pelo
Airflow que se tornou praticamente universal. Ainda assim, a restrita
acolhida desse que foi o mais revolucionário Chrysler produzido até hoje
fez com que o fabricante adotasse uma postura conservadora de desenho
por quase duas décadas. Somente a linha 1957 com o Forward Look teria
uma reação acalorada comparável à causada pelo Airflow, ainda que, em
geral, mais positiva — até por ser mais uma evolução lógica do que se
fazia até ali que uma ruptura propriamente dita.
Alguns revezes
comerciais não impediram a Chrysler de inovar outras vezes, como
com o Turbine de 1963, o
Plymouth Barracuda de 1964, as
minivans de
1984 e o Dodge Viper de 1992.
Se o Airflow não foi bem-sucedido financeiramente, a influência de seu
desenho foi enorme. A partir dali, as formas de um carro nunca mais
seriam percebidas meramente pela identidade de seus logotipos ou mascote
de capô. Não seriam mais valorizadas apenas pelos encarroçadores que customizavam modelos de luxo para a elite. A
bem-administrada Chrysler Corporation ainda conseguiu fazer dinheiro com
outros produtos em plena depressão econômica dos anos 30.
Foi a primeira
de várias demonstrações do incrível poder de se reerguer da companhia
fundada por Walter P. Chrysler em 1925.
Um poder que dá esperanças a quem a vê saindo de sua mais nova — e pior
— crise. Esperanças como a de, talvez, até ver essa fênix ainda criar
algum dia outro carro que, mesmo
de vendas minguadas, tantos gostariam de ter lançado. Em termos históricos, o primeiro
Chrysler aerodinâmico há muito voou para além dos balanços financeiros.
O pioneirismo, a ousadia e o rastro de influência que o Airflow representou continuam fluindo como um sopro de inspiração para
projetos que, como ele, visam emocionar, transgredir velhas regras para
apontar novas ou simplesmente domar o vento.
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