Um anúncio do projeto em 1958
e o modelo definitivo do ZAZ-965, pouco alterado: 3,3 metros, 650 kg,
portas "suicidas" e inspiração no Fiat 600
Na versão ZAZ-965A o motor V4
arrefecido a ar, em posição traseira, crescia de 750 para 900 cm3, mas o
interior mantinha a simplicidade |
Quando a Moskvitch interrompeu a produção da
série 400 — uma versão do Opel
Kadett de 1936, "cortesia" dos alemães junto da entrega do
ferramental da marca alemã como espólio de guerra —, em 1956, o mercado
da antiga URSS, União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, ficou sem
um carro popular, um modelo compacto, simples, econômico e barato para o
transporte básico das famílias. O modelo 402 daquele fabricante, com
quatro metros de comprimento, era grande e caro demais para essa
finalidade.
A substituição do 400 coube à ZAZ (sigla para Zaporizkyi avtomobilnyi
zavod, Fábrica de Automóveis da Zaporíjia, cidade na atual Ucrânia —
curiosamente, a designação em russo para a letra Z parece o número 3),
herdeira de um grupo que iniciou atividades em 1908. Sua fabricação de
automóveis começou em 1960 por um pequeno modelo de dois volumes, duas
portas e motor traseiro, o ZAZ-965 Zaporozhets (nome do natural da
Zaporíjia). Até então era comum a concepção clássica de motor dianteiro
e tração traseira, como no Moskvitch, mas ela não favorecia o espaço
interno em um carro tão pequeno. Diante da baixa aceitação do público
local à tração dianteira, a opção natural foi colocar toda a mecânica na
traseira.
O 965 era um carro sobretudo barato, que podia ser comprado com cerca de
18 salários mensais de um típico trabalhador. Outra equivalência
curiosa, atribuída ao chefe do projeto, era de que ele deveria custar o
mesmo que 1.000 garrafas de vodca. Embora muitos o considerem uma mera
cópia do Fiat 600 lançado em
1955 — carro que de fato foi usado como base para o primeiro protótipo
—, a empresa alegava ser ele um projeto soviético em parceria com a
Moskvitch. Pode ser, mas a inspiração no carro italiano ficava evidente
nas linhas arredondadas, tanto pelo perfil quanto por itens como capô,
faróis, luzes de direção, para-choques, para-brisa, vidros das portas e
rodas.
A maior diferença estava na metade traseira. Enquanto o ZAZ dava
seguimento à linha iniciada nos para-lamas dianteiros e tinha uma
pequena saliência no fim da carroceria, o Fiat interrompia tal linha
ainda nas portas, destacava os para-lamas de trás e não tinha a
protuberância final. Como no 600, as portas do 965 abriam-se para trás,
no padrão conhecido por suicida. E davam acesso a um interior compacto e
simples, com painel em chapa de aço, um diminuto quatro de instrumentos
e grande volante de dois raios. Para-brisa e vidro traseiro, iguais e
intercambiáveis, permitiam contornar a quebra do primeiro em uma viagem
em região sem peças de reposição — o que livrava os ocupantes de seguir
expostos ao frio soviético. Com apenas 3,33 metros de comprimento, 1,39
m de largura, 1,45 m de altura e 2,02 m de distância entre eixos, pesava
650 kg.
Na concepção técnica os modelos italiano e soviético também se pareciam,
mas com diferenças. Embora a ZAZ tenha estudado um motor de dois
cilindros opostos de motocicleta, baixo
desempenho e curta vida útil levaram à opção por algo mais adequado.
Fabricado pela MeMZ (Fábrica de Motores de Melitopol, outra cidade
ucraniana) com uso de alumínio e magnésio e montado em posição
longitudinal traseira, o propulsor do 965 tinha quatro cilindros em "V"
e 746 cm³. Com arrefecimento a ar e comando
de válvulas no bloco, desenvolvia potência de 23 cv e torque de 4,6
m.kgf, suficientes para velocidade máxima de 80 km/h. Sua aparência
lembrava a do boxer do Volkswagen,
exceto pelo ângulo entre as bancadas de cilindros de 90° (180° no
alemão).
A tração era traseira, com a caixa de câmbio manual de quatro marchas
(sem sincronizador na primeira) à frente
do eixo e também de projeto local. A alavanca de mudanças no assoalho
fugia ao padrão da época, na coluna de direção. A suspensão independente
nas quatro rodas tinha barras de torção na dianteira (ao contrário do
Fiat, que usava feixe de molas semi-elíticas transversal) e os pneus
5,20-13 eram maiores que no modelo italiano, pelas más condições de
rodagem do país. Era uma mecânica robusta, fácil de manter — contribuía
o arrefecimento a ar, que evitava o congelamento de líquido dentro do
motor com o carro estacionado sob frio rigoroso — e de reparar. Mas
tinha desvantagens como alto nível de ruído, aquecimento interno
ineficaz (um problema no inverno soviético) e tendência a superaquecer
quando usada em alta temperatura.
Continua
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