


O Islero S, com maior taxa de
compressão e comandos mais bravos, elevava para 350 cv a 7.500 rpm a
potência do motor V12 de 4,0 litros


O interior demonstrava precária
qualidade de construção, mas o Islero compensava esse fato com elevado
desempenho e linhas imponentes
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Atrás o vinco lateral era sublinhado pela lâmina dos pára-choques. Era a
maior ousadia do Islero. Suas lanternas retangulares ficavam logo abaixo
deles e, de cada lado, brotavam escapamentos duplos cromados. Era um
conjunto moderno, mas elegante e discreto. Para alguns, discreto até
demais para chamar atenção entre o charme do Miura e a audácia do
Espada. Daí para um comportamento mais ameno existiria uma enorme
distância. O Islero trouxe uma sutil evolução à mecânica do 400 GT.
Por baixo de seu longo capô guardava o mesmo V12 projetado pela
Bizzarrini, de 3.969 cm³ (82 mm de diâmetro por 62 mm de curso), também
usado no Espada. A potência cresceu 5 cv em relação ao 400 GT, passando
a 325 cv a 7.000 rpm, graças ao aumento de
taxa de compressão de 9,5:1 para 10,5:1. O torque máximo era de 39,9
m.kgf a 5.500 rpm. A Lamborghini manteve os seis carburadores Weber 40
DCOE. Cinco marchas sincronizadas
compunham o câmbio manual. O chassi de tubos retos era o mesmo do GT,
assim como a suspensão de braços
sobrepostos e molas helicoidais tanto na frente quanto atrás, mas a
dianteira vinha com maior bitola. Discos Girling com servo continuavam a
escolha da marca para frear o carro. Tanta semelhança não evitou um peso
maior: se o 400 GT tinha 1.250 kg, o Islero atingia 1.315 kg. Mas
alcançava 250 km/h e para ir de 0 a 96 km/h levava 6,4 segundos.
O motorista se deparava com um painel retilíneo como o exterior do
carro. Só os instrumentos circulares aliviavam a angulação seca dos
volumes com que Marazzi manteve a coerência de estilo. Traços retos
também estavam no elevado console central e nos três raios do volante de
madeira. Se na aparência o interior foi bem projetado, o mesmo não se
podia dizer da qualidade de construção. Sob as queixas acerca da
diferença entre o rigoroso controle de qualidade da tradicional Touring
e o precário do novato estúdio Marazzi, a produção seguiu até meados de
1969. Um total de 125 exemplares havia sido concluído quando a
Lamborghini introduziu o Islero S, que trazia pequenas melhorias
estéticas, mecânicas e, felizmente, também de acabamento.
Com alta taxa de compressão (10,8:1) e os comandos de válvulas do Miura
S, ele entregava 350 cv a 7.500 rpm, levava o Islero S a 260 km/h e a
acelerar de 0 a 96 km/h em 6,2 segundos. A grade recebia novo desenho e
faróis de neblina. A tomada de ar no capô era ampliada e a abertura dos
pára-lamas agora contava com uma borda. As luzes de direção laterais
ovais eram trocadas por circulares e, nos pára-lamas dianteiros, surgiam
entradas de ar. As portas passavam a dispor de quebra-ventos e a base da
coluna traseira esquerda agora tinha uma saída de ventilação. O painel
foi reformulado para, mais que encher os olhos, manter um melhor padrão
de qualidade. Os bancos ganhavam encostos mais elevados e, na traseira,
um apoio de braço. O vidro posterior ganhou desembaçador elétrico.
A produção durou até abril de 1970, rendendo mais 100 exemplares do
Islero. O ritmo intenso de substituições da Lamborghini continuava
implacável como um touro bravo. Naquele ano surgia o Jarama, substituto
do Islero que abdicou da discrição e das proporções clássicas em favor
de detalhes arrojados — e de gosto mais questionável. Não há como
discutir muito sobre qualidade de construção do Islero, mas as críticas
de que faltou a ele o apelo extravagante do Miura e do Espada são
infundadas. Ele foi pensado por Ferruccio para agradar quem valorizava —
e podia ter — o desempenho de um carro da marca, sem querer chamar
atenção por esse privilégio.
É curioso notar que, dois anos mais tarde, a Ferrari passou a oferecer
um modelo com a mesma proposta do Islero, o 365 GT4 2+2. Até o estilo
retilíneo de três volumes era parecido, mas o modelo de Maranello teve
vida bem mais longa, de 1972 a 1989, tendo mudado de nome para 400 e 412
ao longo de sua evolução. Uma prova de que Ferruccio não estava enganado
sobre o apelo de sua idéia de carro para o que os ingleses chamam de
“piloto cavalheiro”, forte do comportamento, discreto na aparência.
Contudo, a imagem de sua fábrica ficaria cada vez mais atrelada a
superesportivos de estilo ousado, sobretudo a partir do
Countach, que levou às raias
do futurismo as linhas retas e ângulos secos do Islero. Mas que não
reste dúvidas de que, por baixo de sua carroceria elegante, o Islero era
como qualquer componente da manada de sonhos criada pela Lamborghini. Só
não era um lobo tentando se passar por cordeiro porque também era, como
seus irmãos, um touro sobre rodas. Um Lambo em pele de cordeiro.
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