Engenharia coroada

Inovador na concepção de motores, W.O. Bentley levou sua marca a
grandes êxitos em Le Mans, mas fracassou como administrador

Texto: Fabrício Samahá - Fotos: divulgação

No alto, o modelo 4.5 Litre com compressor ou "Blower Bentley"; acima, W.O. e imagem de 1912 com o inglês ao volante de um DFP 12-15 HP

De cima para baixo: protótipo do 3 Litre, o primeiro Bentley, em 1919; os carros em corrida em 1922 e a fabricação de chassis em Cricklewood

A marca inglesa Bentley esteve, por mais de 60 anos, associada à Rolls-Royce de tal modo que seus carros passaram a ser, em sua maioria, apenas versões mais informais e esportivas dos que levavam a marca da empresa-mãe. Antes dessa fase, porém, os automóveis Bentley foram símbolo de desempenho e engenharia esmerada, atributos que foram levados a outras marcas, depois da absorção pela RR, por seu fundador W. O. Bentley.

Walter Owen Bentley nasceu em Hampstead, Londres, em 16 de setembro de 1888. Nono de 11 filhos de Alfred Bentley e Emily née Waterhouse, estudou até os 16 anos, quando se tornou aprendiz de engenheiro em uma estrada de ferro em Doncaster. Conduzir uma locomotiva era um sonho de infância que logo se materializou. Na época também pilotou motocicletas Indian, Quadrant e Rex. O aprendizado foi produtivo, mas ele percebeu que não seria suficiente para uma carreira. Passou a estudar engenharia na King's College de Londres e foi trabalhar, em 1910, na manutenção de 250 táxis da marca Unic.

Com o irmão Horace Millner (H.M.), Walter (mais conhecido como W.O. pela convenção de usar as iniciais quando irmãos trabalham juntos) abria em 1912 a Bentley & Bentley, revendedora de carros franceses da marca DFP (Doriot, Flandrin & Parant), disponíveis nos modelos 10-12 HP, 12-15 HP e 16-20 HP. Para ele, colocar os automóveis em competições seria a melhor maneira de promovê-los, e foi o que fez. Logo identificava um ponto fraco na mecânica do DFP — pistões —, que decidiu sanar com a instalação no motor do 12-15 HP de pistões de liga de alumínio de sua fabricação.

Com essa alteração e comando de válvulas mais "bravo", o carro dirigido pelo inglês bateu recordes em Brooklands, em 1913 e 1914, e em subidas de montanha. Na prova Tourist Trophy na Ilha de Man, também em 1914, seu DFP foi um de seis carros ao fim de uma corrida iniciada com 23 veículos. Além de rápido, o modelo francês com pistões britânicos havia se mostrado robusto e confiável.

Com a eclosão da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), Bentley colocou à disposição do interesse nacional sua tecnologia de pistões de alumínio, que permitiam melhor dissipação de calor, o uso de taxa de compressão mais alta e maiores rotações. Logo obteve um contrato para fornecer pistões aos aviões do Serviço Naval e Aéreo Real, sendo o primeiro motor equipado com eles um Rolls-Royce. Mais tarde, W.O. projetaria seus motores aeronáuticos, como o BR1 de nove cilindros e o BR2 — siglas para Bentley Rotary —, em parceria com F.T. Burgess.

Encerrado o conflito, o engenheiro uniu-se mais uma vez ao irmão para fundar a Bentley Motors Limited: queria construir automóveis. No Salão de Londres do mesmo ano, 1919, apresentavam um protótipo ainda sem motor concluído. Em outubro ficava pronto o propulsor de quatro cilindros e 3,0 litros, projetado com a participação de Burgess e de Harry Varley, que vinha da Vauxhall. Em janeiro seguinte começavam os testes com um protótipo; a primeira entrega a um cliente do Bentley 3 Litre acontecia em setembro de 1921.

O automóvel era fornecido como chassi com mecânica, em três opções de distância entre eixos — 2,74, 2,98 e 3,30 metros —, para ser "vestido" por empresas de carrocerias como a Vanden Plas, recomendada pelo fabricante. Isso fez com que o 3 Litre ganhasse diferentes desenhos e formatos, como turismo de quatro lugares, cupê de capota escamoteável e até mesmo boattail, em que a traseira afilada lembrava a proa de um barco. Já na época um Bentley era para poucos: o modelo ostentava o maior preço entre os automóveis de seu porte no mercado inglês, chegando a custar três vezes um carro de potência similar.

O motor, dotado de bloco e cabeçote fundidos em uma só peça, usava comando de válvulas no cabeçote e foi um dos primeiros na história a contar com quatro válvulas e duas velas para cada cilindro. Com potência de 70 cv, levava o 3 Litre a uma velocidade máxima de 130 km/h, que subia para 145 km/h na versão Speed e 161 km/h na Super Sports — ótima marca para o tempo. O carro usava câmbio manual de quatro marchas e freios apenas nas rodas traseiras, embora as dianteiras os recebessem em 1924.

Mesmo grande e pesado (1.800 kg) em comparação aos compactos Bugattis que venciam corridas na época, o 3 Litre foi vitorioso nas pistas: ganhou a 24 Horas de Le Mans, na França, tanto em 1924 quanto em 1927, o que lhe rendeu boa imagem e ajudou a vender. "Corríamos não pela glória ou pelo heroísmo, mas estritamente pelos negócios", explicaria W.O. mais tarde em sua autobiografia. De sua parte, Ettore Bugatti alfinetava o adversário chamando o modelo de "o caminhão mais rápido do mundo".

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Data de publicação: 20/11/11

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