Há
10 ou 15 anos, não eram muitos os brasileiros que tinham bolsas
infláveis, freios com sistema antitravamento (ABS), caixa automática
ou mesmo ar-condicionado em seu carro. Hoje esses itens são bastante
comuns do segmento médio para cima e começam a ganhar presença nos
automóveis menores — os dois primeiros serão obrigatórios em todo
carro novo daqui a pouco mais de três anos, em um programa que
requer sua adoção gradual até se chegar aos 100%.
No entanto, enquanto se tornam mais comuns essas facilidades
tecnológicas em favor do conforto ou da segurança, crescem também as
lendas que envolvem seu funcionamento. Quem nunca ouviu alguém dizer
que "não teria freado a tempo se não tivesse ABS", ou soube de um
caso de protesto porque "o airbag não abriu em uma colisão forte" em
que a frente do carro saiu intacta? Tudo culpa dos mitos que
envolvem essas novas — ou nem tão novas — tecnologias, assunto de
nosso Editorial de hoje.
Com o ABS o espaço de frenagem é menor.
Em termos. O que o ABS faz é modular a aplicação dos freios para
que as rodas cheguem ao limite do travamento, ao ponto de máxima
redução de velocidade sem travar. Se elas travam, o espaço de
frenagem aumenta; se a força de frenagem é insuficiente, ele aumenta
também. Em piso de boa aderência, um motorista experiente
provavelmente conseguiria repetir o efeito do ABS. Já em piso
molhado, na terra ou no barro, um pequeno travamento de rodas pode
até ajudar a frear, embora o dispositivo traga a vantagem de manter
o controle de direção — assim, pode-se desviar de um obstáculo
enquanto se freia intensamente. Nessas condições e, sobretudo, em
pisos com sucessivas irregularidades, a atuação do ABS pode até
aumentar o espaço de parada.
Se o pedal de freio pulsar, deve-se aliviar a pressão sobre ele.
Errado. A pulsação é natural durante a ação do ABS, cabendo ao
motorista manter o esforço no pedal enquanto necessário. É para
evitar o reflexo indesejado de aliviar a pressão que foi inventada a
assistência adicional em frenagens de
emergência, que aumenta a força aplicada aos freios mesmo que o
motorista use menos o pedal do que deveria.
As bolsas infláveis aumentam a proteção oferecida pelo cinto.
Certo. Embora em alguns países de vanguarda as bolsas não sejam
exigidas por lei, elas equipam todos os carros porque seria
impossível atender aos modernos padrões de proteção sem usá-las,
pois o cinto sozinho não retém os ocupantes com a mesma eficiência.
Contudo, é essencial associar bolsa e cinto: sem este último, a
bolsa tem sua eficácia reduzida e pode até ferir o ocupante durante
o disparo, que é muito rápido. |
|
As bolsas devem disparar em qualquer colisão.
Errado. Há parâmetros para sua abertura, que envolvem velocidade no
momento do impacto (em geral a partir de 28 km/h), ângulo da batida
e deformação da frente do veículo. Assim, uma colisão lateral ou uma
capotagem não deve fazer a bolsa frontal abrir, mesmo porque ela
seria inútil. Observe também que o processo de inflar e desinflar a
bolsa é muito rápido, bem menos de um segundo, o que deixa o
ocupante desprotegido caso haja um segundo impacto — como ao bater
num barranco e o carro ser projetado para outro lado, sofrendo nova
colisão. Mais um motivo para usar o cinto!
Com câmbio automático o consumo é maior.
Certo, mas cada vez em menor intensidade. A caixa automática tem
uma forma de transmissão de energia menos eficiente, o que aumenta o
consumo, e muitas delas trazem menos marchas que a manual do mesmo
modelo, de modo que o conversor de torque — o "vilão" do consumo —
precisa ser mais usado. Contudo, as centrais eletrônicas estão mais
aprimoradas, o número de marchas cresceu (hoje há nacionais com seis
e importados com oito) e o conversor tem atuação bem mais
discreta, além de ser bloqueado em
velocidades de estrada. Nessa condição, a perda de energia é baixa e
o consumo fica próximo ao do câmbio manual.
A alavanca da caixa automática pode ficar sempre em "D".
Em termos. Em algumas condições é uma boa medida usar mudanças
manuais, mesmo que o carro não traga a operação sequencial para esse
fim. É o caso de uma descida íngreme de serra, em que mover a
alavanca para 3, 2, 1 ou L — conforme o modelo e a situação — impede
o uso das últimas marchas e produz freio-motor, poupando os freios
do carro. Você também pode passar a "N", ou ponto-morto, nas paradas
mais longas do trânsito para reduzir o consumo, já que o motor deixa
de tentar mover o carro.
Com ar-condicionado, o ar deve ser direcionado aos ocupantes.
Errado, a menos que você esteja em busca de um resfriado. O ar
deve refrigerar o ambiente e não as pessoas diretamente. Para isso,
direcione os difusores para o alto, pois o ar frio tende a descer,
criando um resfriamento homogêneo.
O ar-condicionado aumenta o consumo do carro.
Certo, mas com uma ressalva. Sem ele, tende-se a rodar com
vidros abertos e isso também eleva o consumo — embora em menor grau
— pelo prejuízo à aerodinâmica. De qualquer forma, o aumento de
gasto tem sido menor com os sistemas mais eficientes de hoje e,
afinal, é uma despesa adicional bastante recompensada pelo conforto.
O comando de recirculação deve ficar sempre ligado.
Errado. Por fechar a admissão de ar externo, esse comando evita
a entrada de fumaça, poeira e mau cheiro, além de acentuar a
capacidade do sistema quando o interior já está mais frio do que lá
fora. Mas evite usá-lo por longo tempo: como o ar-condicionado
resseca o ar, nessa condição ele usa um ar já seco e reduz ainda
mais sua umidade, o que pode causar desconforto. |
Há parâmetros
para a abertura das bolsas infláveis. Uma colisão lateral ou uma
capotagem não deve fazer a bolsa frontal abrir, mesmo porque ela
seria inútil. |