Todo proprietário de
automóvel incomoda-se com a depreciação, a perda de valor inerente a um
bem de consumo, sobretudo quando adquirido novo. Embora haja meios de
atenuá-la, conforme a escolha de marca, modelo e até cor, existe um
fator que é difícil de prever e atrapalha bastante: a renovação precoce
do produto pelo fabricante.
A Ford lançou há pouco o Ranger 2005,
com estilo reformulado, mas manteve o painel e o motor diesel já conhecidos. E não
escondeu que logo em março – dentro de apenas sete meses – adotará novos
instrumentos e um propulsor mais potente. É inevitável que os picapes
"novos pela metade" sejam desvalorizados no futuro.
Não é a primeira vez em que isso acontece.
Ainda me lembro bem da reação de donos de Monza ao chamado modelo "1985
e meio", ou Fase 2, lançado em abril daquele ano com evoluções de estilo
e conforto. Foi a primeira vez que a indústria antecipou de tal forma a
renovação de ano-modelo, o que hoje é comum. Pegos de surpresa com seus
modelos 1985 Fase 1 ainda novíssimos, eles protestaram à General Motors
e chegaram a reivindicar a aplicação das melhorias a seus automóveis, o
que evidentemente não aconteceu.
Diversos casos semelhantes vieram desde então, envolvendo de
reestilizações a trocas de motor, todas em momentos inesperados. Em 2002
a mesma GM substituiu o propulsor do Tracker menos de um ano após seu
lançamento no Brasil. O modelo antigo – e submotorizado – tornou-se de
imediato um "mico", como o mercado apelida os veículos de pouca
aceitação.
No ano seguinte foi a vez de o Corsa Classic, o antigo, receber o motor
VHC seis meses depois de lançado. Outra apunhalada em quem comprou uma
"novidade" precocemente envelhecida. A GM repetiria a manobra no fim
daquele ano, com intervalo ainda menor – três semanas: mal colocou no
mercado a Meriva 2004, já a substituiu pela versão
flexível em combustível, deixando
possessos os que tenham adquirido o ano-modelo natimorto.
O problema não se limita, claro, à marca Chevrolet. A Fiat por duas
vezes aplicou novos motores à linha Palio (o Fire 1,25 16V, em fevereiro
de 2000, e o 1,8, três anos depois) quando faltava meio ano para uma
ampla reestilização. Em contrapartida, depois de renovar seu estilo, em
novembro passado, fez o inverso: trocou o motor 1,8 a gasolina pelo
flexível em março último. É de se imaginar a situação de quem optou pelo
"último lançamento" e viu seu carro desatualizado em cinco meses.
São muitos os casos. Na Volkswagen, o Sedã 1300 ficou seis meses com
sistema de elétrico de seis volts e passou a 12 no mesmo ano-modelo
1967. Antes, o modelo 1966 recebera melhorias que seriam incorporadas no
seguinte, ficando conhecido como "modelinho". O que dizer do Gol 1300,
que em um ano passou a 1600? E o Santana, cujo motor 1,8-litro foi
reformulado cerca de um ano depois de lançado?
A própria Ford também aprontou das suas antes do Ranger. O Corcel II, lançado em 1977 com câmbio
de quatro marchas, meses depois foi oferecido com o de cinco. O Fiesta
espanhol durou só um ano, substituído pelo nacional de estilo bem
diferente. O Escort teve a grade modificada em meados de 1996, a seis
meses do lançamento do modelo "Zetec" e seu novo estilo. E o mesmo Ranger, que chegou ao Brasil no final de 1994, ganhou
poucos meses após um painel modernizado, tornando as primeiras unidades
superadas em curto espaço de
tempo. A exata situação que se repetirá agora, uma década mais
tarde.
Claro, não é possível frear a evolução com o pretexto de evitar o
envelhecimento precoce. Mas os fabricantes bem poderiam evitar certas
medidas, que chegam a parecer improvisadas, em respeito ao consumidor.
Muitas vezes, segurar um lançamento por pouco tempo mais pode ser o
bastante para não criar uma situação incômoda – e que dói no bolso.
E quanto ao comprador, o que fazer? Como todo fabricante declara em sua
publicidade que se reserva o direito de alterações sem prévio aviso, não
cabe reparação de nenhuma espécie. A única solução é ficar atento a
publicações como o BCWS, que procuram antecipar essas mudanças, e
esperar o momento certo para comprar a melhor opção: o veículo já
renovado, portanto com expectativa de se manter atual por mais tempo, ou
a versão antiga, neste caso com um expressivo desconto.
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