Meses atrás li o
livro escrito por dois colegas, editores de uma revista de automóveis
existente há 10 anos, que conta sua trajetória e suas expectativas.
Surpreendeu-me um trecho em que, comentando o desafio de adaptar a
publicação aos novos tempos, preocupam-se com o contraste entre a
linguagem que utilizam e aquela em uso por muitos leitores mais jovens,
com frases como "Blz, aki tbm tem caranga socada" ("Beleza, aqui também
tem carro com suspensão rebaixada", para os não habituados).
Esse estranho dialeto, que muda a grafia e faz desaparecer vogais e
acentos, é um fato. Está nas salas de bate-papo da internet e nas
mensagens (ou msgs?) trocadas pelo telefone celular, o que se explica
pelo interesse em escrever mais em menos tempo. Só que o excesso de
gírias já pode ser
notado nas revistas de tuning — mais um termo em inglês
desnecessário que se consagrou como substituto de personalização ou
preparação.
É penoso, mas compreensível. Publicações que não conseguem fornecer
informações práticas, apenas entretenimento — carros "tunados",
"socados",
"irados", de preferência acompanhados de belas garotas —, tendem mesmo a
adotar o vocabulário de quem absorve esse tipo de conteúdo. Da parte do
BCWS, porém, nada disso se justifica. E explicarei por quê.
Vemos nosso idioma sendo maltratado por todos os cantos. Quem passa
pelos pedágios da Dersa (como nas rodovias Ayrton Senna e Carvalho
Pinto) pode ler, no verso do comprovante, informações da Assossiação
Brasileira de Crianças Desaparecidas — isso mesmo, dois "S" onde haveria
um "C". Boa parte da mídia (e até um fabricante de motos há algum tempo)
repete pérolas como 1.000 "cilindradas", erro equivalente a dizer que há
400 distâncias entre Rio e São Paulo. Regência e concordância, então, nem pensar:
"Produtos que o mundo confia" (e não "em que", o correto), dizia um
entre tantos motes que não respeitam as normas do bom português.
Por essas e outras, nós do BCWS entendemos que o leitor merece
mais. Merece ler um texto bem escrito, tão distante quanto possível dos
erros de ortografia e gramática tão comuns por aí. Merece ver palavras
bem empregadas, mesmo que possam não ser do conhecimento de um ou outro
leitor — isso acontecia comigo ao começar, aos oito anos, a ler revistas
de automóveis na década de 1980, e posso assegurar que só aprendi com a
dificuldade inicial, enriquecendo meu vocabulário.
Um princípio que se soma a outros já conhecidos. Como usar o mínimo de
termos de idiomas estrangeiros que possam ser traduzidos (acabamos de
suprimir mais um: spoiler, que substituímos por defletor). Ou prezar a
informação técnica precisa, sem as confusões comuns em boa parte da
imprensa e típicas de quem não conhece bem o assunto abordado. Ou,
ainda, utilizar vírgula para separar a parte inteira da fracionária,
como ao indicar cilindrada — 1,6, 2,0 litros —, e não o arraigado ponto
— 1.6, 2.0 —, que só é certo nos países de idioma inglês.
Para nós, não é o caminho certo ou o errado. É o único, e por ele
seguiremos.
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