O Citroën DS tem uma história interessantíssima: logo depois da
Segunda Grande Guerra, entre 1945 e 1946, a diretoria da Citroën
decidiu fazer uma voiture de grande diffusion, na realidade
uma modernização pura e simples de seu 11CV Légère, o mais famoso
tração-dianteira do mundo. De repente, sem que ninguém até hoje
tenha explicado por quê, o bureau de estudos da empresa,
liderado por um dos nomes mais extraordinários da história do
automóvel, André Lefebvre, resolveu fazer o carro mais avançado do
mundo, quase uma reinvenção do automóvel como conhecido ao tempo.
Tudo começou com sistemas oleopneumáticos e uma grande central
hidráulica para suspensão, direção, transmissão e freios. O DS era
tão diferente que nem macaco tinha: se você tivesse um pneu
furado, bastava colocar um apoio junto àquela roda, usar uma
alavanquinha junto à caixa de roda dianteira esquerda para
levantar a suspensão, tirar a roda, colocar o estepe, recolher o
apoio, baixar a suspensão e continuar rodando – e isso valia
inclusive para dois pneus furados simultaneamente!
Os DS 19, 21 e 23, mas principalmente o 21, com que tive mais
contato, são alguns dos carros mais marcantes que dirigi. Como
andava suave, como freava reto, como era rápido nas curvas! Nas
curtas inclinava bastante, mas lá de dentro quase não se percebia
isso. A carroceria era também a mais avançada existente,
obra-prima de Flaminio Bertoni, com portas largas e espaço interno
enorme, a única a rivalizar |
em conforto com os grandes
americanos, mas com menos tamanho e bem menos peso. Chamava
atenção adoidado, inclusive por causa de seus pisca-piscas na
parte de trás da capota.
Quem o pegasse pela primeira vez raramente se saía bem: a direção
de um só raio (segurada pelo aro) era bastante leve e voltava
sozinha ao centro com muita rapidez, mesmo quando se parava o
carro com as rodas voltadas à guia – ela retornava ao centro antes
que se pudesse desligar o motor. Os freios eram por botão e muita
gente ficava com frenagem mínima ou travava as rodas sem querer.
Depois que se acostumava com ele, porém, vinha o prêmio:
ultra-aerodinâmico, podia-se andar o dia inteiro com as janelas
abertas sem cansaço acústico, passando todo mundo e fazendo 10
km/l a 140-160 km/h.
Claro, todo carro tem seus defeitos. O motor era de antes da
guerra, muito resistente mas nenhum foguete. Problema mesmo era a
manutenção, sempre a ser feita numa boa revenda, a preços
freqüentemente estratosféricos. Até mesmo na França, na década de
1970, já não se encontrava peças de reposição com facilidade.
Hoje, o melhor conselho que se pode dar a alguém que realmente
quer ter um DS é que vá à França e compre dois ou três, em bom
estado, para garantir um certo estoque de peças e andar
tranqüilo...
José Luiz Vieira |