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limitações do rápido teste, o R8 comprovou sua estirpe:
um carro esporte muito rápido, mas acessível mesmo a
motoristas comuns |
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MOTOR
- central-traseiro, longitudinal, 10
cilindros em "V" a 90°; duplo comando
variável nos cabeçotes, 4 válvulas por
cilindro. Diâmetro e curso: 84,5 x 92,8 mm.
Cilindrada: 5.204 cm3. Taxa de compressão:
12,5:1. Injeção direta. Potência máxima: 525
cv a 8.000 rpm. Torque máximo: 54 m.kgf a
6.500 rpm. |
CÂMBIO
- manual automatizado, 6 marchas; tração
integral. |
FREIOS
- dianteiros e traseiros a disco ventilado;
antitravamento (ABS). |
DIREÇÃO
- de pinhão e cremalheira; assistência
hidráulica. |
SUSPENSÃO
- dianteira e traseira, independente, braços
sobrepostos. |
RODAS
- dianteiras, 8,5 x 19 pol; pneus, 235/35 R
19; traseiras, 11 x 19 pol; pneus, 295/30 R
19. |
DIMENSÕES
- comprimento, 4,435 m; largura, 1,93 m;
altura, 1,252 m; entre-eixos, 2,65 m;
capacidade do tanque, 90 l; porta-malas, 190
l (somados); peso, 1.625 kg. |
DESEMPENHO
- velocidade máxima, 316 km/h; aceleração
de 0 a 100 km/h, 3,9 s. |
CONSUMO
- em cidade, 4,8 km/l; em estrada, 10,4
km/l. |
Dados do
fabricante; consumo não disponível |
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Sim, eu disse "forte escorregada de traseira". Mas e quanto aos sistemas
eletrônicos, "salvadores da pátria" que cortam a tração no momento
certo? Estão ali, e ligados, mas — como se trata de um carro esporte de
alta estirpe — a Audi os calibrou para que as rodas possam perder a
aderência até certo ponto quando, aí sim, os tais dispositivos acabam
com a festa, cortando a potência das rodas traseiras, mandando a
cavalaria para a dianteira ou — como percebi — simplesmente "castrando"
a ação do acelerador. Não gostei. No ato perguntei se dava para desligar
o controle de tração. "Claro que dá, mas não comigo aqui dentro."
Como assim? Simples assim! A orientação da Audi para a avaliação
era rígida, por haver outros carros na pista e ser um evento
aberto a motoristas comuns: nada de gracinhas. Aquela curva de 180 graus mereceria ser
concluída numa bela derrapagem provocada, deixando o animal vermelho de
lado para arremessá-lo à curva seguinte, mas... o que seria desse pobre
R8 V10 se todos nesse dia quisessem mostrar seus dotes de piloto, reais
ou imaginários? Daria em problema, claro. Apesar da pista da Capuava ser
um primor de segurança, os espaços são limitados e em alguns trechos
seria possível destruir o poderoso brinquedo. Restou-me a pilotagem
limpa (que sono!) e exibir ao agoniado passageiro meus talentos de bom
aluno, atendendo a seu conselho de acelerar progressivamente, sempre com
o carro alinhado. E assim fiz, mas não sem antes tentar comovê-lo por
mais duas curvas, acelerando o R8 mais que o devido, fazendo tudo
acontecer de novo: a traseira escapar, o aspirante a piloto aqui
contraesterçar, a potência sumir e o carro se realinhar, triste, sem
poder arrancar fumaça branca dos Pirelli P-Zero calçados para a ocasião.
Que pena.
Lugar comum em todos os textos de gente que andou em Audi R8 V10 é "as
costas colam no banco". Sim, é fato, mas a melhor e maior sensação foi,
para mim, a estupenda precisão direcional, garantida pela parceria entre
direção e tração integral. Assim, digo que as laterais das costas colam
no banco. O volante é pesado como deve ser e isso torna a pilotagem do
R8 em pista uma atitude que exige bastante energia. Não há no traçado da
Capuava nenhuma curva de alta onde o carro fique apoiado por tempo
significativo, mas há mudanças rápidas de direção aos montes, muitas
delas em desnível. Alcides sabia o que queria, e quis uma pista daquelas
de não dar respiro, técnica e ao mesmo tempo emocionante, um kartódromo
travado de dimensões gigantes, mas onde o R8 V10 talvez não tenha podido
demonstrar sua faceta mais comentada — o vigoroso V10 FSI de 525 cv e 54
m.kgf.
Afundando o pé nos curtos trechos retos que de uma curva levavam à
outra, a cabine era invadida por um som gutural, grave. E, por mais que
usasse sempre as marchas mais baixas possíveis, fazendo o ponteiro do
conta-giros permanecer a maior parte do tempo acima de 6.000 rpm (o
torque tem pico na marca de 6.500 rpm, enquanto a potência alcança seu
auge em 8.000 rpm), achei que o berro poderia — ao menos dentro da
cabine — ser algo mais, digamos, lancinante. Pronto: achei um defeito.
Mais barítono que tenor, mas nada decepcionante quanto ao poder de
estilingar sua importante massa, 1.625 kg, que somados aos 85 de Agresti
e talvez 70 kg de Gresse e um tanque quase cheio garantem uma marca
final próxima a duas toneladas.. Convenhamos, é um numerão para um
esportivo.
Mas numerão mesmo são os cavalos, 525, bons e puros, sinceros também
apesar de querer, um dia, prová-los soltos de verdade. Sinceros? Isso
mesmo. Acelerar o R8 V10 como mandava o instrutor — com rodas alinhadas
— é algo isento de surpresa. A potência chega de maneira forte, mas
sempre progressiva. Para quem é de um tempo onde motores preparados
estavam na ordem do dia em todas as turminhas, e não apenas
circunscritos a grupos de xiitas que desafiam as cada vez mais
restritivas determinações da sociedade politicamente correta, carros
potentes quase sempre eram sinônimo de intratáveis. A potência se
situava num limite estreito da faixa de giros, antes da qual sofria-se
com engasgos e embaralhadas, comandos "cruzando", faltas e/ou excessos
de carburadores grandes como baldes, cujo acerto previa um funcionamento
crítico e irregular fora da faixa de rotações ideal. Neste V10 não há
nada disso, tudo é música. Em baixa, média ou alta a "orquestra" está
sempre afinada.
Minha primeira volta com o R8 V10 na Capuava acaba, e começo a segunda.
Agora, sem esperança de que Norberto Gresse vá transgredir e me dar a
chance de guiar o R8 sem limitadores, tento fazer o melhor possível,
"desenhar" o traçado, buscar a exatidão de movimentos, a harmonia,
aquilo que uma vez li como saído da boca de um certo Tazio Nuvolari,
piloto de um antecessor deste R8 V10, o
Auto Union Tipo D: "Mani di
seta, piedi di piombo", ou seja, mãos de seda, pés de chumbo. Sem dó do
acelerador nas retinhas, idem quanto ao freio na boca das curvas, mas
sem exageros, sem excessos, e com uma palavra martelando minha mente —
fluidez —, imaginando que ela terá efeitos altamente positivos sobre
minha pilotagem, capricho o máximo que posso. O R8 V10 não escorrega.
Roda sobre trilhos, largos pneus que se apóiam no chão generosamente, e
a dose certa de tração é decidida em milésimos de segundo por sensores
que nem sequer noto agir, atingindo o objetivo final que é ir adiante e
o mais rápido possível.
Faltando três curvas para o fim da volta,
arrisco perguntar: "Tenho mais uma volta?" A resposta é sabida, intuída:
"Não dá, tem muita gente esperando para andar." E era verdade. Mas não
resisto e rebato, "justo agora que estava começando a pegar a mão...".
Pegar a mão do R8 V10? Não, do traçado da Capuava. O topo de linha da
Audi não exige essa coisa antiga de "pegar a mão". Apesar de
rinoceronte, ele é amestrado, faz sempre o que se quer. Gentil como um
seminarista, poderoso como um lutador de vale-tudo e altamente
tecnológico como um novo produto da Apple, exibe orgulhosamente a
linhagem de seus antepassados, os lendários Auto Unions Tipos C e D, que
em sua época — fim dos anos 30 — impressionaram pelas doses
cavalares de tecnologia e pela obsessão pela eficiência, que está
intacta e evidente neste R8 V10.
Despeço-me de Norberto Gresse pedindo desculpas por fazê-lo sofrer e
ouço algo que interpreto como elogio, algo como "você foi um dos poucos
que fez certinho." Ah, ganhei o dia! E agora, depois dessas duas voltas
na Capuava, as coisas em casa voltam ao normal... |