Segurança


O perigo escondido

nos acessórios


Vai equipar e personalizar o carro? Conheça antes

os riscos à sua segurança — e à dos demais motoristas

 


Texto: Fabrício Samahá



Você acabou de comprar um carro, seja ele zero-quilômetro ou semi-novo. Apesar do sabor de novidade — talvez até o cheirinho típico —, percebe que está faltando alguma coisa: um jogo de rodas esportivas, alguns acessórios estéticos ou mesmo um rebaixamento na suspensão. Mais do que chamar atenção, você quer deixar o carro a seu gosto e diferenciá-lo dos milhares iguais a ele que rodam por aí.

Personalizar o automóvel é um hábito arraigado entre jovens de todas as idades, no Brasil ou lá fora. Se cada um se veste como quer, é justo que possa equipar seu carro como deseja. O problema começa quando as alterações fogem às especificações do projeto e passam a comprometer a segurança de seu motorista e dos demais.

"É PRA MELHORAR A ESTABILIDADE"


Rodas bem mais largas, suspensão rebaixada: sensação de estabilidade e riscos à segurança


Uma das modificações mais freqüentes, pelo ganho estético que proporciona, é a troca das rodas originais por esportivas, em geral mais largas e de aro maior. A legislação só se refere a elas ao proibir que ultrapassem a largura dos pára-lamas originais e que o diâmetro do conjunto roda-pneu seja alterado, mas os riscos à segurança começam bem antes. É preciso manter o offset (profundidade de montagem) de fábrica para não alterar a geometria da suspensão e da direção.

Rodas montadas mais para fora, tão apreciadas pela aparência agressiva, podem reduzir a precisão da direção, torná-la muito pesada e até dificultar o controle em freadas críticas, devido à perda do raio de rolagem negativo (leia o quadro abaixo). Pneus muito largos também podem trazer problemas. Não que favoreçam a derrapagem em freadas ou manobras bruscas, como disse uma revista "especializada"... Mas podem antecipar a ocorrência da aquaplanagem — perda de contato do pneu com o solo, devido à água, fazendo o carro "esquiar" —, fenômeno dos mais indesejáveis.

O volante menor parece deixar a direção mais rápida, mas o esforço necessário pode surpreender em emergências


Outro hábito perigoso é o rebaixamento da suspensão, por encolhimento das molas ou corte de alguns elos. Os riscos vão bem além do desalinhamento de faróis citado pela mesma publicação. Em que pese o benefício do centro de gravidade mais baixo, todo o projeto da suspensão se desajusta, com prejuízos à segurança. É comum, por exemplo, que a cambagem dianteira se torne mais negativa (rodas mais afastadas no ponto de contato com o solo) e a traseira não se altere. Haverá, assim, maior geração de força lateral à frente sem aumento proporcional atrás, provocando saídas de traseira em curvas que poucos motoristas sabem corrigir. Além disso, o menor curso das molas solicita a estrutura e os amortecedores trabalham mais próximos do final de curso, o que reduz sua vida útil. Pode-se trocá-los por modelos esportivos, encurtados, mas o desajuste da suspensão permanece.

Comuns em outros tempos, mas ainda adotados por alguns, os volantes esportivos são motivo de preocupação por duas razões. Primeiro: por serem em geral muito pequenos, transmitem a sensação de respostas rápidas, mas exigem maior esforço e dificultam o controle do veículo em emergências. Segundo: em caso de acidente, enquanto o volante original só se deforma, um de baixa qualidade pode quebrar e ferir o motorista. Há quem prefira encurtar a alavanca de câmbio, alteração que raramente dá bons resultados. Os engates ficam mais duros e perde-se em precisão na escolha dos canais (1a.-2a., 3a.-4a. e 5a.-ré).

"É SÓ ESTÉTICA, NÃO TEM PERIGO"


Capas para faróis e lanternas, acessórios mais recentes que buscam estética em detrimento da segurança


Pode ser que você tenha desistido das alterações mecânicas mas continue ávido por acessórios com fins estéticos, como os que modificam faróis e lanternas. Algumas mudanças nessa área vêm de longa data, como os faróis de neblina ou longo alcance ("milha"), nem sempre bem regulados e instalados com critério — é proibido montá-los junto aos retrovisores ou na traseira. E seu uso na cidade é desaconselhável: os de longo alcance ofuscam, pois seu facho é muito alto; já os de neblina têm uma linha de corte tão baixa que não conseguem iluminar placas de sinalização, como a pare dos cruzamentos.

Outras alterações resgatam parte do espírito natalino (a árvore de Natal), como o acréscimo de lâmpadas às lanternas traseiras, que causam desconforto a quem vem atrás nos semáforos à noite. Algum tempo atrás a moda chegou às luzes estroboscópicas, lâmpadas pequenas mas potentes, que mais parecem um flash fotográfico. Deveriam ficar restritas à regulagem do ponto de ignição nas oficinas, mas a criatividade de alguns as levou à traseira dos carros, onde desviam a atenção dos motoristas e incomodam bastante.

Há alguns anos a tendência eram as lanternas fumê, boa parte em desacordo com a norma que proíbe alterar a cor do sistema de iluminação. Em vez de adquirir as lanternas fumê originais, muitos optavam por pintar as de seu carro com tinta preta, diminuindo a luminosidade, ou por substituí-las por peças de baixa qualidade, com luzes de direção incolores em vez da cor âmbar regulamentar.

As películas nos vidros evitam o sol lateral, mas prejudicam mesmo a visibilidade à noite


Hoje a moda é outra: coberturas plásticas que segmentam as lanternas traseiras, em busca, talvez, de um toque de Mustang. Além da redução na área da lanterna (já restrita em modelos como o S10), pode ocorrer a superposição da cobertura às lâmpadas, comprometendo a sinalização de emergência. O abuso chega às "máscaras" com quatro círculos vazados para cobrir os faróis. Embora o fabricante alegue que atendem ao padrão de iluminação exigido por lei, o prejuízo ao foco é garantido — bem mais que a semelhança a um BMW.

Películas escurecedoras de vidros, o popular insul-film, podem ser outro inimigo da segurança. Permitidas apenas em graduação suave (
saiba mais), exigem moderação. Se muito escuras, tornam um risco a direção noturna. Também as faixas no topo do pára-brisa pedem critério: as mais escuras e largas podem ocultar um semáforo e causar um acidente. Alguns chegam ao extremo de aplicar a película nos faróis, tirando-lhes quase toda a luminosidade. Se personalizar o carro é para você um hábito irrenunciável, vá em frente. Mas nunca se esqueça de um acessório fundamental: o bom-senso.


RAIO NEGATIVO DE ROLAGEM


Se a roda não respeitar o offset original pode ser dificultado o controle do carro em emergências


Raio negativo de rolagem é uma característica de projeto da suspensão e direção que pode facilitar em muito o controle do carro em certas situações críticas. É o que ocorre quando a atuação dos freios é desigual, quando se freia sobre pisos de diferentes coeficientes de atrito (duas rodas no asfalto e duas no acostamento de terra, por exemplo) ou, ainda, quando um pneu dianteiro perde subitamente a pressão. O raio negativo auto-estabiliza o veículo, anulando a força que o levaria a girar em torno de uma das rodas dianteiras, sem que o motorista precise intervir no volante ou mesmo perceba sua atuação.

Introduzida no Brasil pelo Passat, em 1974, essa especificação está presente na maioria dos carros atuais. No entanto, o raio de rolagem é diretamente ligado ao offset, ou profundidade de montagem, das rodas — medida que costuma vir gravada nelas com as siglas ET ou PF (ET 38, por exemplo, significa um offset de 38 mm). Uma alteração discreta no offset, como 10 mm, pode já ser suficiente para eliminar o raio negativo. As reações de direção não mais serão as mesmas e pode surgir tendência ao esterçamento em curvas e frenagens. Em caso de falha hidráulica num dos circuitos de freio (dispostos em diagonal sempre que o raio é negativo), a puxada na direção exigirá correção pelo motorista, dificultando o controle do carro. Será que o ganho em estética proporcionado pelas rodas terá valido a pena?


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