Eles podem estar nos vidros laterais ou no para-brisa, colados às
portas ou tomando uma grande área delas, aplicados até à parte
dianteira, mas o mais comum é que venham mesmo na traseira — isso
quando não revestem a carroceria por inteiro. São os adesivos.
Se é verdade que a escolha do automóvel conta ao mundo um pouco de
nossa personalidade, essa divulgação se faz bem mais clara quando
aplicamos um adesivo — ou vários deles — a nosso carro. É o caso
daqueles que se referem a uma universidade, uma academia de
ginástica ou uma profissão (lembra-se do "consulte sempre um
advogado"?), sinais exteriores de algo importante para quem dirige
aquele carro.
Aparentemente esse tipo anda em baixa, talvez pelo receio de revelar
informações que possam ser usadas em um trote de falso sequestro ou
coisa pior. Por outro lado, ainda se veem os de escolas de judô,
caratê e lutas diversas — que acredito serem mais usados pelos não
praticantes, a fim de inibir buzinadas ou provocações pelo motorista
de trás...
O que certamente está em alta, todos já perceberam, é o adesivo da
família feliz. Alguns o adotaram como substituto do tradicional
"bebê a bordo" (ou com o nome da criança na mesma frase), espécie de
explicação a quem vem atrás do motivo para o carro ser dirigido com
especial cuidado, às vezes devagar demais. Outros entraram na moda
com figurinhas engraçadas ou com famílias compostas também de cães e
gatos.
Em outros tempos já foi comum, entre o público jovem, ocupar grande
espaço no para-brisa ou no vidro traseiro — quando não em ambos —
com adesivos relacionados ao universo da preparação de motores, dos
sistemas de áudio e das fábricas de acessórios. De 10 anos para cá,
apliques sobre os mesmos temas ganharam as portas dianteiras, em
geral em fila vertical, dentro do padrão de personalização (não, não
vou chamar de tuning) que a série de filmes Velozes & Furiosos
tornou conhecido mundo afora.
Outro tipo de adesivo é o composto por frases, com as mais diversas
conotações, em geral bem-humoradas. Há aquelas com dicas como "se
você consegue ler isso, está perto demais da minha traseira"; outras
populares, do tipo "é velho, mas tá pago" e "veículo rastreado por
fofoqueiros"; e ainda as que lembram a filosofia dos para-choques de
caminhões, como uma que vi em alguns jipes: "Minha esposa disse, ou
eu o jipe. Às vezes sinto saudades dela". Sem esquecer protestos
como "visite XXX e ganhe uma multa", a ser preenchida com o nome da
cidade que faz das autuações de trânsito uma importante fonte de
arrecadação, e "eu tenho vergonha dos políticos corruptos de YYY",
também aplicável a qualquer região do País. |
Não deixe o amigo
Algumas frases surgiram como campanhas muito válidas, como "friends
don't let friends drive drunk" (amigos não deixam amigos dirigirem
bêbados), lançada em 1990 nos Estados Unidos como parte de um
esforço para reduzir os acidentes por bebida ao volante. Claro que
não demorou até o bom humor tomar conta e criar versões
alternativas: enquanto os adeptos de Ford aplicaram o adesivo "friends
don't let friends drive Chevy", os fãs de Chevrolet colaram o
oposto, "friends don't let friends drive Ford".
Adesivos também podem ser aplicados sem que o motorista deseje, como
os que indicam sua conformidade com a lei. Nos anos 90 houve o
selo-pedágio, que todo carro deveria exibir no para-brisa para poder
circular em rodovias com cobrança dessa tarifa. Como era válido por
um mês, havia quem rodasse diariamente e quem as usasse só uma vez
no período, mas o preço era o mesmo. Uma forma nada justa de cobrar
por um direito, que felizmente foi abolida.
Na mesma década surgiu o selo de licenciamento, mais uma maneira de
informar à fiscalização se o carro estava com a documentação em dia
— nos anos 80, o mesmo papel cabia a uma plaqueta presa à placa
traseira. O selo durou menos de dois anos, mas hoje há outro em seu
lugar: o que indica a aprovação do veículo na inspeção municipal de
emissões poluentes, feita em cidades como São Paulo. Ainda no
para-brisa, os selos colados pelo fabricante na aprovação final são
verdadeiros fetiches para alguns amantes de carros antigos.
Na Europa, por muito tempo foi comum a aplicação à traseira de
adesivos ovais com a sigla do país de origem do carro quando ele
circulasse em território estrangeiro, já que a placa de licença nem
sempre esclarecia sua procedência. A exigência caiu com a Comunidade
Europeia, mas o oval ainda é aplicado em viagens além de suas
fronteiras — ou
como elemento decorativo, até mesmo no Brasil.
Sem dizeres — no máximo com o nome do carro ou da versão — são os
adesivos em forma de faixas, muitas vezes aplicados de fábrica. Se
nos anos 70 as seções pintadas de preto fosco identificavam os
carros esportivos (alguns indignos do termo, com modestos motores na
faixa de 1,4 litro), na década seguinte essa decoração passou a ser
colada e ganhou novos padrões, como as estrias nas laterais do Uno
1.5R ou o degradê do Chevette S/R. Os anos 90 encarregaram-se de
tirar a moda de circulação, substituída pela pintura de cada vez
mais partes na cor da carroceria, mas ela dá sinais de voltar, como
no Ka Sport e em várias versões "aventureiras".
E há os cada vez mais frequentes adesivos que abrangem toda a
carroceria, o conhecido envelopamento. A solução começou em veículos
comerciais e chegou aos personalizados, em geral com o tom preto
fosco. Não sei se já se faz esse trabalho com cores brilhantes que
pareçam a pintura original, mas seria uma ótima opção para quem não
suporta mais carros pretos e prata: você poderia comprar um deles,
envelopá-lo na cor desejada e ainda remover o adesivo para usufruir
a tão propalada facilidade de revenda daquelas duas cores... O
inconveniente é que cada mudança de tom requer alteração no
certificado do carro.
Depois de anos indicando o que o motorista faz da vida, que marcas
aprecia ou de que forma encara os fatos do cotidiano, é comum que os
adesivos sejam todos removidos na hora da despedida, quando o carro
é vendido ou colocado à venda. Para muitos, esse é o momento de
trocar a personalização por um adesivo impessoal, mas que comunica
um importante fato a quem o vê: o de "vende-se" com o telefone do
proprietário. Depois, tudo começa de novo. |
"Amigos não
deixam amigos dirigirem bêbados" foi parte de um esforço para
reduzir os acidentes, mas não demorou até o bom humor tomar conta |