Onde todos somos passageiros

Algumas constatações sobre os táxis, esses carros que rodam o
mundo com tanta variedade de tipos, cores e nacionalidades

por Fabrício Samahá

Eles estão por toda parte, seja em nosso trânsito de todos os dias, seja nos filmes e na televisão, em especial quando se mostram grandes cidades como Nova York. Há até personagem de TV que dirige um — o atrapalhado Agostinho, representado por Pedro Cardoso na divertida série A Grande Família da Rede Globo. São os táxis, esses carros que a maioria de nós, com maior ou menor frequência, usa quando não está ao volante do próprio automóvel.

Táxis são um assunto interessante, a começar pelos carros que seus motoristas escolhem para essa importante função. No Brasil, em tempos bem passados, eram usados grandes sedãs, em geral importados, até que o valente Fusca assumiu também essa função. Criou-se com ele a absurda situação de um táxi ter apenas duas portas, implicando desconforto no acesso do passageiro. Durante algum tempo — contou o amigo Bob Sharp em sua coluna no Best Cars — foi obrigatório remover o banco dianteiro direito para amenizar a inconveniência, exigência revogada após o acidente com um passageiro, cujo cinto não estava preso à estrutura do carro e se soltou na colisão.

Mais tarde ainda houve muito Gol de três portas na "praça" até que as quatro portas se consagrassem também em nossos carros mais simples. Claro, sempre houve automóveis mais confortáveis — caso do Opala — no serviço de táxi especial, como o que atende ao público dos aeroportos. Nos anos 90, talvez facilitada por isenções de impostos na compra, houve uma disseminação de carros mais apropriados no serviço de táxi convencional e tornaram-se comuns os Vectras da geração passada, Santanas e mesmo Omegas, sobretudo em cidades como a capital paulista. É pena que em São Paulo seu conforto tenha ficado no passado, pois a legislação local estabelece tempo máximo de fabricação de três anos.

Hoje, em se tratando de táxi comum, desfrutar um amplo sedã é privilégio de poucos. Vê-se de tudo na categoria, de sedãs pequenos (sobretudo Siena e Classic, mas já com presença relevante do Logan) a furgões de passageiros (como Doblò), passando por muitas minivans. Estas têm participação cada vez maior na frota da capital paulista e isso faz sentido, pois aliam vantagens de carros maiores, como espaço no banco traseiro e facilidade de acesso a pessoas mais corpulentas ou idosas, ao porte de um modelo compacto e um consumo moderado. Outra tendência na cidade é pelas versões "aventureiras", apreciadas pela robustez da suspensão e dos pneus nas ruas esburacadas e repletas de lombadas e valetas.

Falar em consumo faz lembrar a variedade de combustíveis que nossos táxis já usaram. De início gasolina, depois álcool em sua maioria. E foi sobretudo para esse uso, ao lado das frotas de empresas, que se lançou a conversão para gás natural veicular (GNV) na década de 1990. Com um custo por quilômetro rodado muito menor que o da gasolina ou do álcool e, em alguns casos, benefícios adicionais como menor alíquota de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) — caso do estado do Rio de Janeiro —, o gás liderou por longo tempo esse setor, apesar da pequena autonomia, das longas filas para abastecimento nos primeiros anos e da perda importante de espaço para bagagem.

Já nos anos 2000, com o GNV mais caro, as inspeções da conversão mais severas e os motores flexíveis em combustível consagrados, a situação mudou. O gás perdeu espaço e muitos taxistas voltaram a usar álcool nos motores. Ideal mesmo para esse tipo de uso seria o óleo diesel, que tem esmagadora preferência dos "motoristas de praça" mundo afora pela combinação de economia, autonomia, torque em baixa rotação e resistência dos motores, mas aqui tal combustível é proibido para automóveis.

Aliás, resistência sempre foi um aspecto muito considerado pelos taxistas, ao lado do custo de manutenção, razões para que algumas marcas não tenham alcançado até hoje boa participação no setor. E você sabe que motores de táxis costumam durar bem mais que os de carros particulares? O segredo está na regularidade de temperatura de funcionamento, pois é comum que esses automóveis circulem de modo ininterrupto ou perto disso — às vezes até com motoristas se revezando, período após período, sem parar. Como se sabe, os minutos iniciais a frio são os mais críticos para o motor, que trabalha com óleo mais viscoso (grosso) e ainda sem atingir as folgas normais de funcionamento.

Fabrício Samahá, editor

Pelo mundo
Falei acima nos táxis a diesel de outros países, o que leva à curiosidade sobre os tipos de carros usados nesse serviço mundo afora. Há modelos famosíssimos, como o hackney carriage ou táxi londrino, em geral o modelo FX4 fabricado pela Austin, a Carbodies e a LTI. Ou o Checker Cab, grande sedã norte-americano sempre pintado de amarelo, usado por décadas em cidades charmosas como Nova York. Hoje extinto, foi substituído em grande parte pelo Ford Crown Victoria e outros grandões com motor V8, sempre a gasolina — nesse aspecto os Estados Unidos, junto de alguns poucos países de combustível barato, fogem à preferência mundial pelo econômico diesel.

Na Alemanha o Mercedes-Benz Classe E tem presença expressiva, assim como em regiões nobres de outros países — vi vários deles na bela Punta del Este, no Uruguai. Gerações bem mais antigas do mesmo modelo, caso da W123 fabricada entre 1976 e 1984, ainda esbanjam longevidade em nações mais pobres, como se vê com frequência em reportagens na África. No México, até alguns anos atrás, o Fusca — lá chamado de Vocho — permanecia comum. Na Argentina, velhos Renaults 12 e Peugeots 504 dominaram por muito tempo a frota de Buenos Aires, mas nos últimos anos a diversidade tem chegado por meio de Sienas, Polos Classics e Corsas, entre outros.

Nesse ponto os táxis da capital argentina têm ficado mais parecidos com os de São Paulo, mas não em um aspecto: a cor. É um fato natural que táxis usem cores chamativas, que se destaquem em meio ao trânsito, para facilitar sua localização pelos passageiros na rua. É por isso que se usa o amarelo em muitos lugares, como em Nova York, em Tóquio (não é padrão, mas talvez maioria) e, em outro tom, no Rio de Janeiro — nesse caso com uma faixa azul na linha de cintura da carroceria. Em Curitiba e Porto Alegre a cor padrão é o laranja, perfeito para esse fim, além de mais seguro em condições de baixa visibilidade como sob neblina. Em Florianópolis os carros são brancos com capô e tampa do porta-malas vermelhos, também válido.

Buenos Aires usa amarelo, mas só no teto e em suas colunas, sendo o restante preto. Traz a importante visibilidade pelo passageiro (no trânsito denso o que mais se vê é a parte superior da carroceria), mas não serviria para um país quente como o nosso, pois a cor escura absorve muito mais calor. Isso certamente não incomoda no Reino Unido e por isso os clássicos táxis de Londres continuam pretos, embora conste não ser um tom obrigatório. Na cidade do México também há divisão: branco na parte de cima, verde embaixo. Em Milão usam-se carros brancos ou beges, este um tom comum na Alemanha.

Em meio a tantas questões, a prefeitura de São Paulo decidiu anos atrás que a cor oficial seria branca, sendo seguida por outras capitais e cidades. Ótima escolha quanto ao clima, além de ser um tom de pintura sólida (que custa menos que a metálica para comprar e para reparar), mas infeliz quanto à localização pelo passageiro. Além disso, como ninguém gosta de ter seu carro confundido com um táxi, a decisão simplesmente "matou" o branco em veículos particulares — efeito que começou na capital e hoje é sentido mesmo em cidades do interior onde não há cor obrigatória.

Mas os taxistas agradecem pela facilidade em vender o carro usado, sem necessidade de repintura, como se tivesse pertencido à vovozinha que só ia ao supermercado nos fins de semana...

O Checker Cab foi substituído pelo Ford Crown Victoria com motor V8, sempre a gasolina — nesse aspecto os EUA fogem à preferência mundial pelo econômico diesel.

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Data de publicação: 28/8/10

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