Dos esquimós para os trópicos

A Volkswagen anuncia o nome de seu picape médio: Amarok,
mais um estranho batismo entre tantos que já vimos

por Fabrício Samahá

Mesmo sem ter ainda revelado sua versão definitiva — mostrou apenas uma conceitual, que apareceu até no Salão de São Paulo do ano passado —, a Volkswagen anunciou o nome de seu picape médio, a ser fabricado na Argentina e vendido em vários mercados emergentes, entre eles o Brasil: Amarok, que significa lobo no idioma dos inuítes, povo de esquimós indígenas que vive na Groenlândia, no Alasca e no Canadá. Conta a VW que, "para os inuítes, o lobo representa o rei da vida selvagem e impressiona por sua força e robustez, sua resistência e sua superioridade".

É difícil saber como os marqueteiros do fabricante alemão chegaram à conclusão de que tal nome, tão estranho e que tão pouco significa aqui na América do Sul, seria o mais adequado. Talvez o objetivo tenha sido estabelecer uma ligação com os utilitários esporte Tiguan (nome que mescla tigre e iguana) e Touareg (tuaregue, povo nômade do deserto do Saara). Ou, quem sabe, esteja realmente difícil encontrar bons nomes para veículos depois de mais de 120 anos da criação do automóvel.

Sou levado a acreditar mais na segunda hipótese, pelo que tem sido apresentado nos últimos tempos. Exemplo claro é Sandero: o que a Renault pretendia com esse nome tão estranho e sem significado? Sendero — com "e" — significa caminho, trilha em espanhol, mas talvez ficasse muito forte a lembrança de Sendero Luminoso, o grupo terrorista peruano. Se a intenção foi mesmo associar Sandero a sendero, resta saber se a troca da letra afasta o carro dessa infeliz referência.

Alguns anos antes houve os casos de Meriva e Zafira, na Opel alemã e na Chevrolet brasileira. O Google não aponta nenhum significado para o primeiro, enquanto o segundo denomina apenas — além da minivan — uma atriz húngara de poucos pudores, informa o mecanismo de pesquisa... Fico me perguntando: se nada significam e, a meu ver, estão longe de ser nomes bonitos, por que a GM os teria escolhido? O mesmo vale para o Sentra e o Tiida da Nissan (Versa, como o segundo se chama em alguns mercados, ao menos teria clara ligação com versatilidade) e o Picanto da Kia, tão propício a piadas.

Os sul-coreanos, aliás, são mestres na arte de usar nomes estranhos. Logo em sua estreia por aqui, no começo dos anos 90, a Kia trouxe o furgão Besta. A publicidade explicava que o ideia era "Best (o melhor) da série A". Ah, bom... E alegava que o termo resultante não era de todo mau pois lembrava um animal apto ao trabalho, tanto quanto o veículo. Pode ser, mas vi uma ou outra com adesivos encobrindo o nome até que este caísse no conhecimento popular. Depois vieram o Espero e o Nubira da Daewoo, o Sephia e o Opirus da mesma Kia e o Azera da Hyundai, que vem de adzera, uma língua falada em Papua Nova Guiné. Que nome nobre para um sedã de luxo... Ao menos o Kia Credus foi rebatizado aqui para Clarus.

Fabrício Samahá, editor

Gerados em computador
Há denominações que não têm significado porque foram definidas em computador, como Lexus — que me transmite requinte e imponência — e Jetta. Usado pela Volkswagen alemã há muito mais tempo do que no Brasil, desde a primeira versão de três volumes do Golf (1980), o nome tem uma estranha pronúncia correta ("iéta") e requer muita boa-vontade para ser associado a luxo, esportividade ou qualquer outro atributo do modelo. De qualquer forma, o batismo de seu antecessor (Bora) e o que ele tem na Argentina (Vento) não me parecem muito melhores.

Outros nomes podem até ter origem interessante, mas soam estranhos em alguns idiomas. Há casos clássicos como o do Ford Pinto norte-americano, que certamente não seria vendido assim no Brasil, e o do Mitsubishi Pajero, que em países de língua espanhola se chama Montero (o nome original é uma gíria nesse idioma para alguém que se masturba). Sorento (vila no Estado norte-americano de Illinois), Santa Fe (capital do estado do Novo México, também nos EUA) e até Chana (comuna francesa na região de Ródano-Alpes) podem ter seu charme em outros países, mas não aqui — sobretudo o último, por motivos óbvios. E Verona, a cidade italiana de Romeu e Julieta, não impede a alusão a uma Vera pouco feminina, como sugeriu um jornalista na apresentação do modelo da Ford em 1989.

Às vezes o problema está em outro produto que usa a mesma marca. O Kadett quase se chamou Astra por aqui (já tinha tal nome na versão britânica da Vauxhall), até que a GM descobriu que se chamava assim uma empresa de acessórios sanitários. Por algum motivo, a associação com tampas de privada não foi mais considerada obstáculo quando o Astra belga foi importado (o nome Kadett não mais era usado na Europa), em 1994, e quando a geração seguinte ganhou produção nacional, quatro anos depois. Antes, a GM havia descartado o nome Parati para a perua Chevette, lançada em 1980 como Marajó, pois em pesquisa houve quem o relacionasse a pinga. Mas o batismo foi adotado dois anos depois pela VW em uma concorrente — que teve cotado o nome Angra, abandonado pela possível associação com a usina nuclear, com algo que pudesse explodir.

O fato é que acabamos acostumados a nomes estranhos, sobretudo os que chegam aqui estampados em modelos de sucesso mundo afora, como Corolla (a coroa de uma flor, em italiano). Se o picape da VW se chamar mesmo Amarok no Brasil, é provável que em alguns anos não haja mais quem torça o nariz para ele. E se, em último caso, a rejeição for tamanha que acabe por prejudicar o êxito do utilitário e leve a marca a um novo batismo, ainda terá servido para ensinar aos brasileiros um pouco do idioma inuíte.

Outros nomes podem até ter origem interessante, mas soam estranhos em alguns idiomas. Há casos clássicos como o do Ford Pinto e o do Mitsubishi Pajero.

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Data de publicação: 6/6/09

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