O salão da desorganização

Transtornos dos preparativos para a visita presidencial
marcaram o início do 23º. Salão do Automóvel de São Paulo

por Fabrício Samahá

Fabrício Samahá, editorEm todo salão do automóvel, mundo afora e aqui, os organizadores reservam para a imprensa os dois dias que antecedem a abertura oficial. Isso é feito para facilitar a produção de fotos e imagens, uma vez que o grande público que comparece à mostra tornaria virtualmente impossíveis esses trabalhos. É nesses dois dias também que os expositores – fabricantes e importadores – reúnem os jornalistas para lhes apresentar suas novidades e comentar o desempenho da empresa, nas chamadas entrevistas coletivas. Elas são programadas com antecedência e distribuídas por um dia e outro.

Como salão é notícia aqui e em qualquer lugar do mundo, é natural que leitores, telespectadores, ouvintes e internautas queiram conhecer as novidades do evento. A ampla divulgação pela mídia que se segue interessa muito ao organizador e aos patrocinadores, pois atrai visitantes para os dias normais de funcionamento.

Nesta quarta-feira (20/10), segundo dia de imprensa do 23º. Salão Internacional do Automóvel de São Paulo, os trabalhos seguiam normalmente na parte da tarde, quando a organização avisou pela rede de alto-falantes que todos deveriam deixar o recinto e seguir por determinada saída. O aviso, dado por volta das 15h30, era por ordem do serviço de segurança da Presidência da República, que faria no local a operação de varredura antes que o presidente Lula chegasse ao Salão, para abertura oficial marcada para as 19h.

Os jornalistas, fotógrafos e cinegrafistas – brasileiros e estrangeiros – trabalhavam intensamente, esmerando-se em fazer o melhor trabalho possível dentro do tempo que lhes restava. Cerca de 30 profissionais usavam os computadores da sala de imprensa para escrever as matérias e enviá-las às redações, espalhadas pelo país e no exterior. Uma entrevista coletiva da Mitsubishi estava em andamento; outra, da Citroën, constava prevista para logo mais – 16h45 – no programa distribuído aos jornalistas.

E então começaram os transtornos. As coletivas tiveram de ser abreviadas, com óbvia desvantagem para esses fabricantes em relação aos demais. Com o fechamento da circulação pelo pavilhão, profissionais que estavam em outros setores foram impedidos de chegar ao local das entrevistas citadas, sendo também prejudicados. Tudo bem mais cedo do que o esperado, já que a previsão era de que a coletiva da marca francesa fosse concluída às 17h30.

O Anhembi começou a ser esvaziado. Executivos de fábricas, perplexos, deixaram os estandes apressados. A sala de imprensa foi rapidamente evacuada, e os computadores, desligados antes da conclusão de trabalhos. Jornalistas e expositores foram direcionados para uma saída que não a habitual, até chegar a uma área externa do pavilhão de exposições. Lá fora, o vento e uma fraca garoa aumentavam a sensação de desconforto dos 16° C de uma tarde atípica de outubro.

Ali ficaram, como se fossem um grupo de desclassificados, durante quase duas horas, até que pudessem voltar – muitos foram embora, indignados. O acesso dos jornalistas foi então liberado, mas apenas para a sala de imprensa, que a essa altura estava desprovida de serviços como água e café. Algum tempo depois foi facultada a circulação pelo evento só aos cerca de 100 jornalistas que possuíam credenciamento da presidência da República. Mesmo para esses, horas preciosas haviam sido perdidas em meio ao injustificável transtorno – o que tornou impossível, por exemplo, a atualização do BCWS durante aquele dia.

É fácil imaginar o prejuízo a fabricantes e importadores, ao trabalho dos jornalistas. Prejuízo ao Salão e à sua divulgação na mídia, gerado pela desorganização.

Culpa, a princípio, da assessoria de imprensa da Presidência, que tem obrigação de saber que todo salão do automóvel tem dois dias completos reservados para a imprensa. Portanto, jamais poderia ter programado a varredura para aquele horário (15h30), já que não haveria como efetuar a operação sem interromper a atividade dos jornalistas.

Culpa também do organizador, a Alcântara Machado, nesse negócio há 30 anos e portanto sabedor que os dois dias são usados integralmente pela imprensa. Faltou informação aos jornalistas sobre o processo de varredura, faltaram condições apropriadas para a espera dos profissionais durante o período de acesso impedido ao pavilhão.

Por fim, culpa também da associação de fabricantes de veículos (Anfavea), do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças) e da associação dos importadores (Abeiva), que como patrocinadores da festa maior do automóvel deveriam ter-se certificado de que nada disso fosse acontecer.

O 23º. Salão Internacional do Automóvel de São Paulo passa à história como um espetáculo inesquecível, mas de desorganização inicial. Que sirva de lição para o futuro.

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Data de publicação: 23/10/04

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