Todo ano vêem-se lançamentos de modelos retrô no Salão de Detroit e
o deste ano mantém o padrão. O que começou com o Volkswagen Concept One,
em 1994 — o hoje bem conhecido New Beetle —, torna-se uma tendência cada
vez mais evidente, que atinge diversos fabricantes e não só americanos.
Fico-me perguntando até que ponto isso vai ao encontro dos anseios do
consumidor. Questiono-me como seria se a mesma estratégia fosse
estendida a tudo que é fabricado. Por exemplo, aviões: dá para imaginar
um jato intercontinental com cara de Lockheed Constellation da década de
1940? Ou geladeiras: como ficaria uma clássica General Motors Frigidaire
numa cozinha atual?
Se a moda retrô se difunde, seria o caso de a Ferrari relançar o 166 MM
ou a Maserati produzir um novo 450S. Ambos, sobretudo o segundo, foram a
expressão do (belo) estilo italiano que assombrou o mundo depois de 1945
e fez escola. Mas, fora a novidade inicial, será que seriam acolhidos
pelos mercados? Ainda está vivo na memória de muitos o Plymouth Prowler,
um verdadeiro porém moderno hot-rod, mas que teve vida curta.
Fazia furor por onde passava, mas, e daí? É preciso algo mais num
automóvel além de fazer furor.
Vejam-se os casos do New Beetle e do Porsche 911. O primeiro trouxe do
Fusca original apenas a linha básica, pois suas entranhas nada têm a ver
com o carro criado por Ferdinand Porsche. É somente um cenário sobre
quatro rodas, já que na verdade não passa de um Golf com outra
carroceria. Só que um Golf piorado em quase tudo, do espaço interno ao
de bagagem, passando pela aerodinâmica.
Já o 911 veio evoluindo desde sua primeira aparição em 1963 e, passados
40 anos, é o mesmo carro, mas com sabor de história e evolução — e que
evolução! Só o motor cresceu 80,8% em cilindrada. Pode ser classificado
como um retrô que avançou no tempo. Seu sucesso, nem é preciso dizer.
Quando, em 1989, a Mazda resolveu reinventar o roadster inglês e
seu espírito motor dianteiro-tração traseira, lançou o Miata (MX5 na
Europa) sem apelar para o visual retrô e agradou em cheio. O carro foi
vendido bem acima do preço público sugerido, durante pelo menos cinco
anos, e é hoje o recordista de vendas entre os modelos esporte. Fico
surpreso de outros fabricantes ainda não terem captado a simples
mensagem: não existe o “Em algum lugar do passado” em automóvel. Só vale
como brincadeira.
Por isso, quando surgem criações (?) como os novos Ford Thunderbird (que
tem vendido muito mal), Chevrolet Nomad e Shelby Cobra, por mais que os
fabricantes jurem que só as linhas básicas invocam o modelo original, na
verdade estão apelando para o sentimento retrô. O Corvette, por outro
lado, está na linha do 911 e seu estrondoso sucesso a cada geração não é
por acaso.
A indústria deve usar o passado, sim. Mas como base que lhe permita
olhar para a frente com mais certeza para saber o que está fazendo.
Afinal, o gênio criador humano não tem limites.
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