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Fabrício Samahá - edição de 4 de outubro de 2003 |
Não é novidade para o leitor do BCWS que tem crescido a
dificuldade em segmentar os automóveis e utilitários. Publicamos
artigo a respeito recentemente e
nos deparamos com essa questão, muitas vezes, ao definir que modelos
incluir em um comparativo. Fit concorre com Meriva? Meriva compete com
Picasso? EcoSport disputa, afinal, com o quê? Com Fit?!
Fabricantes e importadores não escapam desse dilema. Mas, ao contrário
do site, que pretende esclarecer as diferenças para evitar comparações
injustas ou despropositadas, o que interessa para eles é, muitas vezes,
tornar nebulosa a distinção entre formatos, tamanhos e categorias, a fim
de colocar seus modelos em posição vantajosa — seja em preço, seja em
volume de vendas.
Um caso tradicional é o dos muitos sedãs médio-pequenos que buscavam
concorrer com o Vectra — um médio-grande — quando este era a referência
em sucesso na categoria, anos atrás. Mégane, Corolla, Civic e Marea,
todos classificados pelos padrões internacionais em um segmento inferior
ao do carro da GM (portanto, o mesmo do Astra), eram apresentados por
seus fabricantes como competidores do Vectra, o que os beneficiava na
comparação de preços.
O mesmo artifício foi usado pela Honda, em fevereiro, para anunciar um
bom resultado de vendas do Civic. A comparação incluía o Vectra e
eliminava o (então líder) Astra da categoria de "sedãs médios", de modo
a levar o carro nipo-brasileiro à primeira posição. Já a GM não deixou
de fora o modelo da Honda ao destacar sua liderança entre os "compactos"
(Astra é compacto?!) no primeiro trimestre deste ano... Imagine o nó na
cabeça do consumidor.
Se a marca americana foi a prejudicada nesses episódios, certamente teve
seu momento de gerar confusão entre as categorias em proveito próprio. O
material de imprensa da Meriva, em 2002, a colocava como concorrente da
Scénic (o que ela de fato é) e... da Xsara Picasso, bem maior, mais cara
e bem-equipada. Uma clara distorção de conceitos, já que a minivan da
Citroën compete na prática com a Zafira, embora tenha dois lugares a
menos. O BCWS apontou de imediato a manobra da GM, mas não se
sabe de outra mídia que o tenha feito.
Em outra situação, há marcas que procuram segmentar os carros pelo
preço, desprezando qualquer outro fator, de modo a obter melhor posição
no mercado. Há dois ou três anos, a Mercedes-Benz apresentou à imprensa
estatísticas de vendas que mostravam seu Classe A em segunda posição "na
categoria". Diante do espanto dos jornalistas, explicou seu critério:
carros de R$ 30 mil a R$ 45 mil. Nessa faixa, apenas o Vectra vendia
mais, já que as versões de maior volume do Golf, Astra e outros modelos,
na época, custavam menos de R$ 30 mil.
Há pouco, em setembro, foi a vez da Renault. Divulgou à imprensa que a
Scénic havia assumido a liderança do segmento de "monovolumes médios",
em que concorreria apenas com Zafira e Picasso. A marca francesa pode
enxergar o mercado como quiser, mas para o BCWS não há nenhuma
razão para eliminar desse grupo a Meriva, que tem porte, preço e
motorização compatíveis com a Scénic — e, aliás, vende mais que esta.
Se a propaganda é a alma do negócio, não resta dúvida de que cada marca
sempre encontrará um meio de destacar seus produtos e seus resultados de
mercado, mesmo que distorcendo certos conceitos ou os interpretando de
modo discutível. Cabe à imprensa — e o BCWS não se esquece desta
missão — desfazer o nó e apresentar ao leitor os fatos isentos desses
desvios.
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