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Ressuscitar o Fusca

Edição no. 138 - 30 de novembro de 2002

Mesmo antes de assumir, o novo governo federal já avisou: quer mexer no perfil do carro popular. A receita atual de vincular a menor incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) à cilindrada do motor parece não agradar àqueles que dirigirão o Brasil pelos próximos quatro anos.

Parece que neste país os dirigentes ainda não conhecem indústria automobilística. Devem achar que fábrica de automóveis é como uma padaria gigante: é só alterar a massa à noite que o pão sai diferente na manhã seguinte. Burocrata parece não saber que decisões de produto são tomadas quatro, cinco anos antes que o veículo chegue aos pontos de venda. E que requerem uma coisa chamada investimento.

Desde que começou o incentivo aos carros com motores de baixa cilindrada, em 1993, o que se viu foi um crescimento notável da produção brasileira, que de 600 mil chegou a históricos dois milhões de unidades em 1997. Nunca chegou a existir, de direito, o nome "carro popular", mas a expressão ficou, e para sempre. Teria sido idéia do então presidente Itamar Franco, que viu no Fusca da namorada Lisle Lucena a quintessência do carro popular? Afinal, era o "carro do povo", não?

Os únicos automóveis que tiveram concessão do governo da época para continuar com motor 1.600 foram o Fusca "Itamar", o querido carro que uma vez ressuscitado mais parecia um zumbi nas ruas e durou pouco, e o Chevette L, que tinha dia certo para acabar -- aquele em que o Corsa chegasse, alguns meses depois. As fábricas, entendendo e assimilando a mensagem, trataram de investir e desenvolver os motores de 1,0 litro, chegando a alguns resultados notáveis.

Só que então vêm os arautos da vida simples, sem as benesses da tecnologia, eternos críticos da "sociedade de consumo" -- esquecendo que para haver consumo tem de haver produção e, para haver produção, só empregando pessoas. E dizem: "Onde já se viu, carro popular com direção assistida, ar-condicionado, tudo-elétrico, que dá 160 km/h?"

Foi a mensagem dada pelo governo que assumirá em janeiro: um carro popular, despojado e barato, em que tamanho -- neste caso, cilindrada de motor -- não seja mais documento. Significa mexer em toda a indústria automobilística, mais uma vez.

Como se não bastassem os motores de 1,0 litro jogados na lata do lixo da noite para o dia no final de julho último, quando os carros de 1,0 a 2,0 litros foram incentivados por forte redução de imposto e seus preços se aproximaram dos de motor 1,0-litro. Motores modernos, de caro desenvolvimento, como os do Fiesta Supercharger e Gol/Parati Turbo, tornaram-se quase inviáveis diante dos menos eficientes 1,6-litro de cada marca. E a questão não se resume à motorização.

Segundo O Estado de S.Paulo, Luís Marinho, presidente licenciado do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC paulista, defende que o benefício tributário se concentre em automóveis de antiga geração como Gol, Uno e Santana, deixando de fora "modelos sofisticados", com "ar-condicionado, por exemplo".

Quando o Fusca começou de fato sua vida comercial na Alemanha de 1948, seu acabamento era austero, igual ao do carro que Adolf Hitler vislumbrara para o trabalhador alemão. O Fusca só decolaria depois que Heinrich Nordhoff, o executivo-chefe da Volkswagen, viesse a criar, menos de um ano depois, uma versão Exportação, cheia de pequenos requintes. Custava 5.450 marcos, 10% mais que o modelo básico. Foi o sucesso do qual todos somos testemunhas.

Exemplos similares constam de nossa história. Nos anos 60, o projeto dos carros populares fracassou porque muitos compradores, em busca de conforto e aparência, gastavam mais em acessórios pós-venda do que a vantagem que obtinham na compra. Mais recentemente pudemos acompanhar como modelos de entrada, como Mille e Celta, ganharam itens de conveniência reivindicados pelo consumidor. Este Fiat, aliás, oferece ar-condicionado desde 1992, quando um singelo retrovisor interno dia/noite ainda era opcional.

A mensagem neste tempo de transição de governo esquece um aspecto básico de marketing: a isca deve agradar ao peixe, não ao pescador. O rei-mercado pediu o "popular" de hoje e a indústria atendeu. E com louvor.

Ou será que vão propor a segunda ressurreição do Fusca?

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