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por Iran Cartaxo  

Dutos do coletor: polir ou não polir?


Ao ler a preparação do Gol GTI, em que o leitor deseja leva-lo a 250 km/h, fiquei um pouco preocupado com a dica que menciona o polimento do coletor de admissão. Tal prática, muito usada num remoto passado de competições, não produz melhoria alguma na performance global do propulsor, como também faz perder performance. Tal fato se dá porque um coletor de admissão polido não provoca turbulência necessária para a mistura fresca ficar homogênea. As saliências das paredes dos coletores são propositais para tal fato, mesmo que usemos combustíveis gasosos ainda assim precisamos de turbulência. Indiscutivelmente, com o polimento teremos um fluxo de ar próximo ao laminar (teoricamente um aumento da EFv), contudo dentro do câmara não teremos todo o combustível distribuído igualmente.

Paulo Mateiro
Santo André, SP
pmateiro@hotmail.com

Caro Paulo, nós do BCWS há tempos sentíamos falta de suas participações, principalmente o consultor Iran Cartaxo, que sempre gosta de um bom papo sobre engenharia.

Essa questão sobre polir ou não dutos de admissão e escapamento em motores é realmente muito discutida. A principal razão desta discussão é o argumento de que o polimento seria prejudicial, pois levaria o escoamento a se tornar laminar, prejudicando a emulsificação do combustível (o ato de o combustível se misturar ao ar, de forma a perder a característica de gotinhas dispersas e passar a se comportar como um gás, compondo a mistura). E parece um argumento sólido.

Por outro lado, os defensores do polimento argumentam que ele torna o escoamento laminar, permitindo maior vazão. Mesmo com o desperdício de combustível pouco emulsificado, isso se justificaria pela possibilidade de contornar a perda de capacidade energética (devido à menor eficiência de queima de uma mistura pouco emulsificada), aumentando a quantidade de combustível na mistura. Isso aumenta -- em termos estatísticos -- a quantidade de combustível queimado, apesar do desperdício. Mas, quando o que se quer é potência, tudo é válido. Este parece também outro sólido argumento.

Tudo não passaria de uma questão de escolha entre ter mais potência, desperdiçando combustível, ou ter menos potência, com maior eficiência. O fato é que ambos os argumentos estão errados e essa discussão é, de certa forma, infundada e desnecessária.

Ambos estão errados porque são baseados em uma suposta laminaridade do escoamento no interior dos dutos de admissão do motor, mas isso está longe de ocorrer. O escoamento dento de um coletor é de alta velocidade em um duto com muitas curvas e acidentes -- borboletas, sensores, difusores. Além disso, é um escoamento pulsado, devido à abertura e fechamento das válvulas, ou seja, nem de longe tem chance de ser um escoamento tranqüilo, como é exigido para se formar um fluxo laminar.

Mas uma coisa é verdade: realmente são observados ganhos de potência quando se faz o polimento dos dutos, assim como é observado desperdício de combustível nesta prática. Então, como podem ser as conclusões corretas mas a argumentação errada?

As conclusões são baseadas em observações e medições, por isso estão corretas. Mas a explicação para o que é observado independe disso. Então cabe perguntar: qual a explicação real? O ganho de potência observado quando se faz o polimento dos dutos é devido ao aumento de seu diâmetro com o polimento. Mesmo um aumento discreto, de 1 mm ou 2 mm no diâmetro destes dutos, faz uma boa diferença na capacidade de fluxo. Como se vê, nada tem a ver com escoamento laminar.

Mas, se o escoamento não é laminar, então a emulsificação do combustível permanece normal: portanto, de onde vem a queda de eficiência que provoca o desperdício de combustível? Ou, por que os fabricantes não fazem logo os dutos polidos? Bem, os fabricantes utilizam o diâmetro dos dutos dimensionado conforme um compromisso entre as curvas de torque e potência e regimes de giros para aquele motor. Além disso, deixar as paredes dos dutos lisas seria caro e não teria função.

E mais -- e aí está a razão maior do desperdício de combustível: as rugosidades nas paredes dos dutos servem de trampolins para eventuais gotículas que tenham aderido à parede retornarem ao fluxo de mistura. Novamente, nada tem a ver com laminaridade do fluxo, mas provoca um desperdício de combustível, já que as gotas aderidas não chegarão à câmara no momento certo para queimar corretamente.

Outra componente da queda de eficiência é o aumento da quantidade e velocidade do fluxo (o motor ganha capacidade de giro), provocado pelos dutos de maior diâmetro -- todo escoamento mais rápido tem perdas maiores. No fim, chegou-se à mesma escolha: polir dutos e ter maior potência com maior desperdício, ou não polir e ter menor potência com mais eficiência.

Ao menos agora se sabem os reais motivos desta escolha. E fica liberado o preparador de ter que polir os dutos até parecerem espelhos. As ruguinhas do interior do coletor não fazem mal a ninguém e até ajudam -- o objetivo é aumentar o diâmetro dos dutos e não os deixar lisinhos.

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Data de publicação deste artigo: 12/3/02

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