Consultório de Preparação


por Iran Cartaxo


Gol GTS com turbo e comando bravo


Existe algum problema em colocar um comando bravo ao mesmo tempo que um turbocompressor? Como seria o desempenho de um Gol GTS com comando bravo e turbo a 0,5 bar de pressão? Por que quando se coloca um turbo é necessário trocar o escapamento?

Orlando Higa
orlando@cpqd.com.br
Campinas, SP


Uma das grandes lendas que envolvem o mundo das preparações é a da impossibilidade de combinar elementos do veneno aspirado com a sobrealimentação. Este tipo de incompatibilidade não existe: pode-se combinar um comando bravo com um turbo, sim, mas não é prática muito usual -- salvo no setor de preparações para arrancada, onde cada cavalo pode ser decisivo.

Essa lenda tem um único apoio consistente. Tanto o turbo como a preparação aspirada visam a aumentar o volume de mistura admitida pelo motor. O turbo comprime ("empurra") a mistura, permitindo que mais ar e combustível entrem nos cilindros. O veneno aspirado reduz as restrições ao fluxo dos gases, o que permite ao motor maior liberdade na aspiração. O motor em geral passa também a atingir regimes mais altos de giros. Assim, durante um mesmo período de tempo, o motor efetua mais ciclos, queima mais combustível e produz mais potência.

As curvas de potência (as mais altas) e de torque estimadas para o Gol GTS original (em azul), com comando de 288o e turbo a 0,5 kg/cm2 (em verde) e com comando original e turbo a 0,7 kg/cm2 (em vermelho)

Clique aqui para ver as curvas de potência e torque ampliadas


O receio dos preparadores de combinar venenos é a mistura ar-combustível atingir um volume tal que, com o cruzamento entre a válvula de escape e a de admissão (quando elas ficam abertas ao mesmo tempo), a mistura chegue a sair pela válvula de escape durante a admissão. Esse fenômeno ocorre com freqüência em carros altamente preparados, como os de arrancada, e implica grande desperdício de combustível, o que pouco importa nessas competições. Na preparação para rua, contudo, existe uma preocupação com o consumo e a combinação de comando e turbo deve ser feita com critério.

A maior vantagem de combinar comando bravo e turbo é poder atingir maior potência sem o recurso a altas pressões ou rotações elevadas. A maior desvantagem é que o comando bravo reduz o torque em baixa rotação, o que pode prejudicar a dirigibilidade antes da entrada em funcionamento da turbina (quando o motor passa a contar com torque de sobra). A curva de torque menos plana também acentua a percepção da entrada do turbo, o que pode causar certo desconforto.

O que se deve fazer para uso em rua é utilizar o turbo com um comando não muito bravo, com duração de no máximo 288° para os motores Volkswagen AP. O levantamento das válvulas (lift) não influi na perda de mistura, causada apenas pelo cruzamento, mas não se deve exagerar neste parâmetro para não perder muito torque antes da entrada da turbina. Um comando já bastante esportivo para uso de rua com turbo seria, na linha VW, um 288° com 11,5 mm de levantamento. Como o Gol GTS já possui um comando um pouco bravo, só teremos ganho apreciável com a troca de comando se partirmos para o 288°.

Simulamos o desempenho do comando 288°, associado a turbo e intercooler com pressão de 0,5 kg/cm², e também o do motor original com turbo a 0,7 kg/cm². Confira:

  Original Comando de 288° e turbo a 0,5 kg/cm2 Turbo a 0,7 kg/cm2
Potência máxima 99 cv 179 cv 176 cv
Rotação de potência máxima 5600 rpm 6000 rpm 5600 rpm
Velocidade máxima 175 km/h 213 km/h 212 km/h
Rotação à velocidade máxima 5285 rpm 6430 rpm 6400 rpm
Aceleração de 0 a 100 km/h 11,5 s 6,4 s 6,5 s
Torque máximo 14,9 mkgf 21,3 mkgf 26,5 mkgf
Rotação de torque máximo 3600 rpm 3900 rpm 3600 rpm
Alongamento recomendado na relação de transmissão - 6,6 % 14,4 %
Aumento recomendado na injeção de combustível - 41,7 % 58,3 %
Aceleração longitudinal no interior do veículo 0,54 g 0,97 g 0,96 g
A margem de erro é de 5% (para cima ou para baixo), considerando-se instalação bem-feita. Calculamos a aceleração de 0 a 100 km/h e a aceleração longitudinal máxima (sentida no interior do automóvel) a partir da eficiência de transmissão de potência ao solo do carro original. Para atingir os resultados estimados pode ser necessária a recalibragem da suspensão, reforços no monobloco e/ou o emprego de pneus mais largos. A velocidade máxima estimada só será atingida com o ajuste recomendado da relação final de transmissão. Os resultados de velocidade são para velocidade real, sem considerar eventual erro do velocímetro. A rotação à velocidade máxima é calculada considerando a relação atual de transmissão.
Algoritmo de simulação de preparação de motores desenvolvido pelo consultor
Iran Cartaxo, de Brasília, DF.


O desempenho obtido é maior que empregando só um turbo a 0,7 kg/cm², mas perde-se em torque e os regimes de potência e torque máximos sobem um pouco. Assim você terá um carro turbo diferente, que "inexplicavelmente" anda mais do que deveria.

Para o motor com turbo a 0,5 kg/cm² e comando bravo, o diferencial do atual Gol de 1,6 litro (relação de 3,89:1) é uma boa opção para alongar -- em 6,4% -- a relação final de transmissão do GTS, cujo diferencial é de 4,11:1. No caso do turbo a 0,7 kg/cm² com comando original, pode ser mais indicado substituir o câmbio completo pelo do Gol 1,8 da época (1990-94), cuja quinta marcha de 0,68:1 (0,8:1 no GTS) representa alongamento de 15%, muito próximo ao recomendado na simulação. O carro assim modificado terá "casamento" adequado entre as rotações de potência e velocidade máxima, ficará mais silencioso e econômico na estrada e com um escalonamento de relação muito apropriado a motores turbo, em que a rotação cai bastante nas mudanças de marcha.

O turbocompressor é uma máquina de fluxo, assim como uma roda d'água, um cata-vento ou uma turbina hidrelétrica. Esse tipo de máquina retira energia de um fluido para funcionar, que pode ser água, vento ou, no caso do turbo, os gases de escapamento. Quando a turbina retira energia dos gases estes perdem pressão. Para que não ofereçam resistência ao fluxo de gases que sai do motor, o que prejudicaria o desempenho, é necessário um sistema de escapamento com maior diâmetro que o original. Apesar da menor velocidade, a maior área de escoamento permitirá melhor vazão dos gases. Caso o escapamento não seja trocado, o fluxo de gases de escapamento será contido, o que prejudica a exaustão do motor e impede a turbina de girar em toda sua capacidade. Além de não ser capaz de desenvolver altas pressões, a turbina passa a se aquecer além do ideal.

Para baixas pressões de superalimentação, até 0,4 kg/cm2, pode-se manter o escapamento original. Para pressões superiores é recomendável trocá-lo, pois o motor estará produzindo mais gases de escapamento e estes necessitam de um escapamento mais largo para não prejudicar o funcionamento do conjunto.



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